A mineração de ouro está presente em quase todos os estados da Amazônia Legal, camuflada sob o título de garimpo. Porém, o garimpeiro do século XXI não é mais o profissional com picareta e bateia, que percorre cursos d’água da região atrás de pepitas nos sedimentos de leitos de rios. Hoje, a mineração de ouro na Amazônia faz-se com maquinário pesado, de alto custo financeiro e significativo impacto socioambiental. Esse cenário é agravado pela complexidade da legislação nacional.
O ouro (Au) é um elemento químico classificado como metal de transição, encontrado em estado puro na forma de pepitas e depósitos aluviais, em minerais como o quartzo e em pequenas inclusões de rochas metamórficas. Utilizado há séculos como moeda de troca, o ouro tem alto valor comercial e é o mineral extraído da Terra com maior diversidade de aplicações.
Tamanha utilidade deriva de uma série de propriedades especiais. O ouro conduz eletricidade, não mancha, é muito fácil de trabalhar, é altamente maleável, se liga a muitos outros metais, pode ser derretido e fundido em formas altamente detalhadas e, é claro, tem um brilho muito atraente aos olhos.
Ao longo da história do nosso planeta, quase todas as culturas estabelecidas usaram ouro para simbolizar poder, beleza, pureza e realização. Além da fabricação de moedas, o ouro é um artefato amplamente utilizado na joalheria, na decoração, na indústria eletrônica, na nanotecnologia, na odontologia e até mesmo na medicina.
No entanto, nem tudo o que envolve o ouro se traduz em benefícios. Na verdade, a mineração deste metal nobre gera uma série de impactos ambientais e sociais, em diversas escalas: de alterações geomorfológicas até complicações de saúde para as comunidades locais e trabalhadores.
A mineração de ouro está acelerando a destruição da floresta amazônica, um ecossistema biologicamente diverso que atua como um freio ao aquecimento global. A mineração de ouro também é responsável por liberar grandes quantidades de mercúrio no ar e na água da Amazônia.
O mercúrio contamina peixes, pessoas e outros animais. Em uma cidade na Amazônia peruana, níveis nocivos de mercúrio foram registrados em 80% dos residentes locais. O boom da mineração de ouro não é um bom presságio para a Amazônia nem para todas as comunidades, locais e globais, que dependem dela.
No Brasil, metade das terras indígenas está ameaçada pela mineração. Em 2021, o projeto Amazônia Minada detectou 1.265 requerimentos de mineração em terras com registros da existência de povos isolados. Além da contaminação por mercúrio, os garimpos também são responsáveis pela proliferação de doenças, como a malária.
A mineração de ouro em pequena escala tem pouco efeito sobre os corpos d’água, mas a prática em grande escala de extrair ouro do minério pode ter efeitos negativos tremendos na qualidade da água. O ouro normalmente se encontra em minérios e sedimentos que contêm substâncias tóxicas como o mercúrio. Quando os rios são dragados para extrair grandes depósitos de ouro, essas substâncias tóxicas flutuam rio abaixo e invadem a teia alimentar.
A contaminação da água afeta negativamente as populações de animais selvagens e as populações humanas. Duas minas de ouro a céu aberto em Montana, nos EUA, foram fechadas em 1998, mas continuam a custar aos contribuintes do estado milhões de dólares em esforços de recuperação e tratamento de água.
O cianeto usado nessas minas para lixiviar ouro do minério resultou em níveis tão altos de poluição que as pessoas não podem usar os recursos hídricos próximos até que tenham sido submetidos a tratamento e purificação extensos e caros.
A maioria das formas de mineração de ouro envolve a movimentação de grandes quantidades de solo e rocha, o que pode ser prejudicial para o habitat da vida selvagem circundante. A Agência de Proteção Ambiental dos EUA estima que o desenvolvimento de uma mina de ouro e cobre proposta para a Baía de Bristol, no Alasca, destruiria pelo menos 38 quilômetros de riachos que sustentam a maior pescaria de salmão vermelho do mundo.
Milhares de acres de pântanos e lagoas também seriam destruídos pelas operações diárias da mina proposta. As comunidades locais dependem fortemente desta pescaria e seriam afetadas pela destruição do habitat.
As operações regulares em minas de ouro afetam o meio ambiente de várias maneiras. Por exemplo, a operação de grandes equipamentos de mineração requer combustível e resulta na emissão de gases de efeito estufa. No entanto, potenciais acidentes com minas e vazamentos representam uma ameaça ainda maior aos recursos terrestres e hídricos próximos.
Rejeitos contaminados precisam ser armazenados atrás de uma barragem; a falha de tal estrutura resulta na liberação generalizada de substâncias tóxicas. As minas devem operar estações de tratamento de águas residuais para remover cianeto, mercúrio e outros metais tóxicos da água usada para mineração, e uma falha da estação de tratamento também pode resultar em contaminação catastrófica da paisagem circundante.
A mineração industrial moderna de ouro destrói paisagens e cria grandes quantidades de lixo tóxico. Muitas minas de ouro despejam seus resíduos tóxicos diretamente em corpos d’água naturais. A mina de ouro Lihir, em Papua Nova Guiné, por exemplo, despeja mais de 5 milhões de toneladas de lixo tóxico no Oceano Pacífico por ano, destruindo corais e outras formas de vida oceânica. As empresas de mineração de ouro e outros metais no total despejam pelo menos 180 milhões de toneladas de resíduos tóxicos em rios, lagos e oceanos a cada ano.
Para limitar os danos ambientais, as minas costumam construir represas e colocar o lixo tóxico dentro delas. Mas essas barragens não impedem necessariamente a contaminação do meio ambiente. Os resíduos tóxicos podem infiltrar-se facilmente no solo e nas águas subterrâneas ou ser libertados em derrames catastróficos. Nas cerca de 3.500 barragens construídas no mundo para conter resíduos de minas, um ou dois grandes derramamentos ocorrem a cada ano.
Em 2014, uma barragem desabou na mina de ouro e cobre Mount Polley na Colúmbia Britânica, enviando cerca de 25 milhões de metros cúbicos de resíduos carregados de cianeto para rios e lagos próximos. O derramamento envenenou o abastecimento de água, matou peixes e prejudicou o turismo local.
A mineração de ouro sujo geralmente leva a um problema persistente conhecido como drenagem ácida de mina. O problema surge quando a rocha subterrânea perturbada pela mineração é novamente exposta ao ar e à água. Os sulfetos de ferro (muitas vezes chamados de “ouro do tolo”) na rocha podem reagir com o oxigênio para formar ácido sulfúrico. A água ácida drenada de minas pode ser de 20 a 300 vezes mais concentrada do que a chuva ácida e é tóxica para os organismos vivos.
Os perigos aumentam quando essa água ácida corre sobre as rochas e remove outros metais pesados incrustados. Rios e riachos podem ser contaminados com metais como cádmio, arsênio, chumbo e ferro. O cádmio tem sido associado a doenças hepáticas, enquanto o arsênio pode causar câncer de pele e tumores.
A intoxicação por chumbo pode causar dificuldades de aprendizagem e desenvolvimento prejudicado em crianças. O ferro é menos perigoso, embora dê aos rios e riachos uma camada viscosa cor-de-laranja e cheiro de ovo podre.
O uso de mercúrio na mineração de ouro está causando uma crise global de saúde e meio ambiente. O mercúrio, um metal líquido, é usado na mineração de ouro artesanal e em pequena escala para extrair ouro de rochas e sedimentos. Infelizmente, o mercúrio é uma substância tóxica que causa estragos na saúde dos mineiros, sem falar na saúde do planeta.
Quando o mercúrio entra na atmosfera ou atinge rios, lagos e oceanos, ele pode viajar por grandes distâncias. Além disso, o mercúrio é extremamente prejudicial à saúde humana. A quantidade de vapor liberada pelas atividades de mineração provou causar danos aos rins, fígado, cérebro, coração, pulmões, cólon e sistema imunológico.
A exposição crônica ao mercúrio pode resultar em fadiga, perda de peso, tremores e mudanças de comportamento. Em crianças e fetos em desenvolvimento, o mercúrio pode prejudicar o desenvolvimento neurológico.
O Amazonas possui 2.857 processos de mineração ativos na Agência Nacional de Mineração (ANM), em várias fases de tramitação, atingindo uma área de cerca de 12.800.016 hectares, o que corresponde a 8% de todo o seu território. Eles referem-se a 69 substâncias distintas, mas a maior parte da área requerida (34%) é para extração de minério de ouro, cujos requerimentos tiveram aumento de 342% em relação à média dos dez anos anteriores.
Os números estão contidos no relatório técnico sobre o panorama do interesse minerário no Amazonas – desenvolvido pela organização indigenista Operação Amazônia Nativa (OPAN), em conjunto com o Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS) e com a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), a partir de informações do Sistema de Informações Geográficas da Mineração (Sigmine), banco de dados sustentado pela ANM.
“Houve um aumento assustador na procura pelo ouro em 2020, muito por conta do momento político que estamos vivendo, mas também pela valorização do minério no mercado internacional” explica Renato Rodrigues Rocha, indigenista do Programa de Direitos Indígenas da Operação Amazônia Nativa (Opan).
O momento político citado está associado às tentativas do Ministério da Economia de viabilizar o licenciamento ambiental para projetos de exploração minerária considerados “estratégicos” ao País e à tramitação do PL 191, que liberaria a mineração em territórios indígenas.
Neste contexto, o relatório aponta para vários indícios de irregularidades nos processos de cooperativas de garimpeiros, que têm pleiteado lavras de minério de ouro contíguas ou muito próximas entre si. Confira.
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