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Avaliação foi feita por participantes de um painel sobre transição energética na conferência anual do Centro de Pesquisa para Inovação em Gases de Efeito Estufa. Para os cientistas, os próximos anos serão cruciais para o enfrentamento da emergência climática

Por Agência FAPESP* | A década em que estamos agora é fundamental para enfrentar a emergência climática global e os entraves situam-se mais no campo geopolítico do que no tecnológico, afirmaram os participantes de um painel sobre transição energética na conferência anual do Centro de Pesquisa para Inovação em Gases de Efeito Estufa (RCGI), realizada na última terça-feira (25/10), em São Paulo.

“A questão é muito mais política, ou melhor, geopolítica, do que tecnológica”, afirmou o pesquisador Paulo Artaxo, professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (IF-USP) e autor-líder de um capítulo do mais recente relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC).

“A guerra na Ucrânia mudou totalmente a questão energética e, além disso, há diversos novos governos de extrema direita, como na Itália, na Suécia e assim por diante, com uma nova perspectiva política que afetará tudo, incluindo os resultados da COP 27 [27ª Conferência da Organização das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas], que começará em algumas semanas no Egito.”

De acordo com o pesquisador, a ciência já conta com a tecnologia necessária para reduzir à metade as emissões globais de gases de efeito estufa até 2030. O desafio tecnológico ocorrerá depois, para diminuir além disso. “Não temos muito mais tempo; temos esta década em particular para mudar. Se não mudarmos até 2030, provavelmente diremos adeus a tudo o que estamos conversando aqui”, ressaltou Artaxo.

O vice-presidente de Engenharia de Tecnologia da companhia anglo-neerlandesa Shell, Ajay Mehta, que também participou do painel, concordou. “Esta é uma situação insustentável. Se não agirmos nos próximos cinco, sete ou dez anos, o jogo acaba. Todos nós temos um papel a desempenhar.”

Ao lado da FAPESP, a Shell financia o RCGI – um Centro de Pesquisa em Engenharia sediado na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP). Com investimentos de R$ 63 milhões, o RCGI busca tornar a ciência brasileira referência internacional de apoio às estratégias de setores público e privado no combate às mudanças climáticas.

Segundo Artaxo, em termos geopolíticos, o mundo encontra-se num momento muito mais complicado agora do que na COP anterior, do ano passado, pois as tensões entre Estados Unidos, China e Rússia aumentaram, assim como as tensões entre o mundo desenvolvido e os países em desenvolvimento. O Brasil, no entanto, apresenta, na opinião dele, uma vantagem estratégica, pois pode cortar 44% das suas emissões de forma rápida e barata, simplesmente evitando queimadas e desmatamentos na Amazônia. “Além disso, nenhum outro país tem potencial tão grande em energia eólica e solar. O Brasil tem de explorar essa vantagem estratégica para minimizar os problemas relacionados à vulnerabilidade [à mudança climática].”

Os participantes ressaltaram a importância da manutenção das florestas e dos sumidouros naturais de carbono, além do reflorestamento. “São Paulo é a prova de que dá para conciliar a produção crescente de alimentos e o reflorestamento de áreas degradadas”, comentou o diretor-geral e científico do RCGI, Julio Meneghini.

O diretor geral de P&D e Inovação da Shell, Oliver Wanbersie, afirmou que um desafio no ambiente das empresas privadas é o de refletir sobre a grande competitividade entre as companhias e a necessidade de proteger as inovações com patentes, por exemplo. “Precisamos repensar o que devemos ou não compartilhar diante da urgência das mudanças climáticas para caminharmos juntos e mais rápido”, afirmou. “Há uma necessidade de colaboração e de flexibilidade. Precisamos produzir mais energia, mas com uma pegada muito menor.”

Os painelistas acreditam que haverá ainda décadas de tensão por causa da crise climática, mas que será uma missão possível, embora turbulenta, enfrentar o aquecimento global. Não há nenhuma bala de prata, ressaltaram. “Concordo que os biocombustíveis não vão ser a única solução. Devem ser uma pequena parte dela”, disse Meneghini. “No entanto, é possível integrar isso com a produção de hidrogênio, como estaremos fazendo em pequena escala com financiamento da Shell, e com a produção de combustível sustentável para a aviação.” O hidrogênio é visto por muitos como um combustível estratégico para o futuro por não emitir poluentes quando utilizado.

Os especialistas também mencionaram que ainda há poucos incentivos para os projetos de captura e armazenamento de carbono (CCS, na sigla em inglês). “Por que há apenas 40 projetos de CCS no mundo? Por que não tem nenhum projeto desse no Brasil? O custo ainda é muito alto”, disse Ajay Mehta. A captura, o armazenamento e o uso do dióxido de carbono são percebidos como ferramentas para mitigar a mudança climática. Um projeto em desenvolvimento pelo RCGI prevê o armazenamento em cavernas salinas em alto-mar do gás extraído junto com o petróleo em poços offshore. Esse gás é considerado refugo e normalmente é liberado nas plataformas petrolíferas.

O painel sobre transição energética ocorreu no Centro de Difusão Internacional da USP, durante o Energy Transition Research & Innovation (ETRI 2022), a primeira conferência anual do RCGI a ser realizada presencialmente após a emergência da COVID-19.

* Com informações do Centro de Pesquisa para Inovação em Gases de Efeito Estufa (RCGI).

Este texto foi originalmente publicado por Agência FAPESP de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original. Este artigo não necessariamente representa a opinião do Portal eCycle.


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