As renas dominam a arte de comer e dormir simultaneamente, realizando cochilos estratégicos enquanto mastigam pela segunda vez
Em contraste com a narrativa popular que pinta as renas como incansáveis puxadoras de trenós durante o mês de dezembro, a verdade é que o auge desses animais ocorre durante o verão, quando enfrentam uma temporada intensa. Para lidar com a pressão, as renas, assim como nós, humanos, recorrem à multitarefa.
Segundo uma pesquisa divulgada pela revista Scientific American hoje, publicada originalmente na revista Current Biology, as renas dominam a arte de comer e dormir simultaneamente, realizando cochilos estratégicos enquanto mastigam pela segunda vez. Esse fenômeno, conhecido como ruminação, vai além do simples processo digestivo, revelando-se como uma habilidade crucial para sobreviver em um período tão agitado, conforme destacado por Gabriela Wagner, zoóloga do Instituto Norueguês de Pesquisa em Bioeconomia e coautora do estudo.
A pesquisa, que utilizou eletrodos de eletroencefalografia não invasiva (EEI) em quatro renas, revelou que, independentemente das condições de iluminação (constante luz, escuridão total ou meia luz para simular dia e noite), esses animais dedicam cerca de uma hora diária ao sono REM (movimento rápido dos olhos) e aproximadamente 5,5 horas ao sono não REM.
A descoberta surpreendeu os pesquisadores, especialmente considerando que as renas não parecem ajustar seu padrão de sono durante os longos dias de verão, um período crucial para maximizar a ingestão de alimentos e se preparar para o inverno rigoroso e a temporada de reprodução iminente.
A chave desse aparente paradoxo reside na ruminação, um processo compartilhado por várias criaturas, desde girafas até ovelhas, que se alimentam principalmente de materiais ricos em celulose. Esses ruminantes, equipados com múltiplas câmaras estomacais, realizam a ruminação para otimizar a digestão de alimentos difíceis de decompor, como grama e folhas.
Além de seu papel na digestão, a ruminação oferece uma oportunidade para as renas atenderem à sua necessidade de sono, proporcionando aproximadamente 6,5 horas diárias ao longo do ano, conforme destacam os pesquisadores.
Oleg Lyamin, pesquisador do sono da Universidade da Califórnia, destaca que essa descoberta complementa estudos anteriores em diversas espécies, demonstrando que a ruminação pode ocorrer tanto durante a vigília quanto durante o sono não REM.
Embora o estudo tenha manipulado as condições de iluminação, a equipe de pesquisa reconhece a necessidade de análises mais realistas em ambientes naturais, visando esclarecer conflitos entre comunidades indígenas, como os Sámi, criadores de renas, e indústrias exploradoras de recursos. Wagner destaca que o conhecimento tradicional sobre a necessidade das renas de permanecerem tranquilas para ruminação não é um mito, mas uma realidade fundamental para esses animais desde o nascimento.