Deputados e senadores precisam assumir responsabilidade quando analisam e votam projetos que favorecem a destruição ambiental
Por WWF-Brasil — O mais recente relatório do IPCC-Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, divulgado nesta segunda-feira (28), precisa ser lido com atenção pelos parlamentares brasileiros – notadamente, os mais ávidos por aprovar o Pacote da Destruição, que abre a floresta amazônica a níveis de destruição sem precedentes, colocando-a mais perto do ponto de não retorno.
O relatório do Grupo de Trabalho II do IPCC cobriu riscos climáticos, impactos e como a adaptação poderá ajudar a reduzir a vulnerabilidade às mudanças climáticas e gerenciar os riscos. Ele reforça que já estamos vendo impactos negativos substanciais no aquecimento global de 1,1°C, causado pelo acúmulo de gases de efeito estufa na atmosfera. No caso do Brasil, a principal fonte desses gases é o desmatamento.
“Se o Governo Bolsonaro deixar como legado um arcabouço legal que favoreça o desmatamento em uma nova escala de grandeza, como estamos vendo durante sua gestão, ele estará nos legando também um futuro no qual desastres como o que vimos em Petrópolis (RJ) serão cada vez mais frequentes e destruidores”, adverte Renata Camargo, especialista em Mudanças Climáticas do WWF-Brasil. É o caso dos projetos de lei 2633/20 e 510/21, que tratam de novas regras para a regulação fundiária e possuem alto grau de permissividade. Se aprovados, colaborarão para o aumento de eventos climáticos, uma vez que fragilizam todo o arcabouço legal de proteção ambiental.
Renata Camargo destaca ainda: “O relatório do IPCC é um alerta para deputados e senadores, que precisam assumir sua responsabilidade quando analisam e votam projetos que favorecem a destruição ambiental. Há uma série de futuros diante de nós – o que fazemos hoje afetará as emissões, o nível de aquecimento global e a gravidade dos riscos climáticos no futuro. Cada fração de um grau conta”.
O relatório do IPCC também constata os benefícios dos esforços de adaptação para diminuir os impactos dos eventos extremos. “Há muito a ser feito em adaptação à emergência climática no Brasil: desenvolver e implantar políticas públicas de ocupação de solo alinhadas ao novo normal, com ênfase em habitação, saneamento recuperação das bacias, bem como dar mais robustez aos sistemas de alerta e à Defesa Civil, são fundamentais em um país onde mais de 8 milhões de pessoas vivem em áreas de risco de deslizamentos e/ou enchentes”, analisa Camargo.
Entre os impactos das mudanças climáticas constatados pelos cientistas estão a redução da produtividade agrícola, a maior insegurança alimentar, o aumento da pobreza extrema e o maior deslocamento de populações. O relatório também aponta para maior insegurança hídrica e energética. “Já estamos sentindo esses impactos e vendo suas consequências. O agravamento deles poderá ser fatal para uma nação em desenvolvimento como o Brasil. Precisamos mudar essa trajetória agora e a mudança começa com o fim do desmatamento”, ressalta a especialista em Mudanças Climáticas do WWF-Brasil..
Soluções imediatas
O relatório do IPCC também informa que, se investirmos em soluções de adaptação agora, podemos construir resiliência e ajudar a proteger as pessoas e a natureza. Cada país precisa conduzir uma avaliação de suas vulnerabilidades para identificar o risco de mudança climática e as prioridades de adaptação.
“A negligência com os riscos climáticos de Petrópolis contribuiu para tragédias como a que vimos neste mês. Mas o Brasil tem inúmeras localidades em risco de eventos extremos – lembrando que só em 2022 já tivemos seca no Sul e enchentes na Bahia. Ou seja, nossa agricultura, que sofre com secas cada vez mais graves e mais recorrentes, precisa ter suas vulnerabilidades contempladas com medidas de adaptação”, explica Alexandre Prado, diretor de Economia Verde do WWF-Brasil.
A perda e a degradação dos ecossistemas tornam os impactos das mudanças climáticas ainda piores. Ao proteger e restaurar a natureza, podemos reduzir os impactos em nossas comunidades. Devemos investir e acelerar soluções baseadas na natureza, como a restauração de florestas, de manguezais e etc., para ajudar a proteger comunidades e ecossistemas vulneráveis. Por isso, o relatório recomenda que os países façam mais para ampliar as soluções baseadas na natureza para adaptação ao clima e incorporá-las em seus Planos Nacionais de Adaptação e suas Contribuições Nacionalmente Determinadas – documentos que integram o arcabouço legal do Acordo de Paris.
Por fim, o relatório ressalta que determinados ecossistemas e espécies – incluindo populações humanas vulneráveis – não têm capacidade de adaptação aos impactos climáticos. Os limites de adaptação estão sendo ultrapassados, levando à migração forçada e à extinção de espécies. O IPCC estima que 10% das espécies terrestres estarão seriamente ameaçadas até 2040 por causa da deterioração das condições climáticas.
“Precisamos de cortes rápidos, profundos e sustentados nas emissões de gases de efeito estufa para diminuir o ritmo do aquecimento global e dar uma chance aos esforços de adaptação. Se conseguirmos reduzir rapidamente as emissões e investir em soluções agora, mitigaremos os riscos climáticos futuros para as pessoas e a natureza. Todos os países precisam revisar suas NDCs [Contribuições Nacionalmente Determinadas, em tradução livre] para alinhar com a meta de 1,5°C e enviá-las para que a COP 27, que será realizada no final deste ano, seja um ponto de inflexão na atual trajetória de aquecimento do planeta acima de níveis seguros para a humanidade”, lembra Prado.
Sobre o IPCC
O IPCC – Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas – foi criado em 1988 pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente e pela Organização Meteorológica Mundial com o objetivo de sintetizar e divulgar o conhecimento mais avançado sobre as mudanças climáticas. O IPCC não produz pesquisa original, mas reúne e resume o conhecimento produzido por cientistas de alto nível independentes e ligados a organizações e governos para embasar políticas mundiais globais e nacionais.
O relatório do Grupo de Trabalho II é a segunda das quatro partes do Sexto Relatório de Avaliação do IPCC (AR6). O relatório do Grupo de Trabalho I (ciência física das mudanças climáticas) foi lançado em agosto de 2021, enquanto o relatório do Grupo de Trabalho III (mitigação das mudanças climáticas) será divulgado em abril de 2022. O Relatório Síntese, que reúne informações dos três relatórios do grupo de trabalho, será lançado em outubro de 2022.