Uma das mais enigmáticas metrópoles da antiguidade, Teotihuacán, situada a cerca de 50 quilômetros da Cidade do México, revela cada vez mais sobre sua importância cerimonial e política por meio das descobertas arqueológicas realizadas em sua icônica Pirâmide da Lua. Restos mortais de cerca de 200 animais, incluindo águias-reais, lobos, onças-pintadas e cascavéis, foram encontrados em câmaras dedicatórias, oferecendo um vislumbre do papel central desses seres nas práticas religiosas e sociais da antiga cidade.
Teotihuacán foi o epicentro cultural e político da Mesoamérica entre 100 a.C. e 650 d.C., abrigando cerca de 100 mil habitantes em seu auge. Mais de mil anos antes do florescimento asteca, a cidade já orquestrava elaborados rituais que combinavam sacrifícios humanos e animais como parte de seu calendário religioso e das performances sancionadas pelo Estado. Na maior câmara descoberta, chamada Enterro 6, arqueólogos identificaram um dos maiores exemplos de sacrifício animal em massa já registrados na região.
Pesquisas lideradas pela antropóloga Nawa Sugiyama, da Universidade da Califórnia em Riverside, revelaram detalhes impressionantes sobre esses animais, que ocupavam o topo da cadeia alimentar. Estudos multiarqueométricos, como a análise química dos ossos, demonstraram que muitos deles tinham o milho como base de sua dieta. O milho, além de ser um alimento essencial na Mesoamérica, possuía um significado espiritual profundo: era considerado a matéria-prima da criação humana, unindo simbolicamente homens e animais em uma narrativa cósmica.
Entre os achados mais notáveis estão os restos de 18 águias douradas, associados ao calendário cerimonial de 365 dias de Teotihuacán. Esses animais eram transportados por oficiais em procissões pela Calçada dos Mortos até a Pirâmide da Lua, simbolizando poder e conexão com o divino. Hoje, as águias-reais permanecem um ícone no México, aparecendo em eventos nacionais, como o desfile da Independência.
Os rituais não eram apenas manifestações religiosas, mas também demonstrações de poder político e controle estatal. Sacrifícios realizados em locais como a Pirâmide da Lua funcionavam como espetáculos públicos, reforçando a soberania dos governantes teotihuacanos. A interação entre humanos e predadores de ponta, muitas vezes arriscada e simbólica, também evidenciava uma tentativa de dominar e se alinhar com as forças da natureza.
Teotihuacán, declarada Patrimônio Mundial pela UNESCO, continua a fascinar pesquisadores e o público. Descobertas como as de Sugiyama, que estuda os restos ósseos com tecnologias avançadas, revelam nuances sobre a interação entre humanos, animais e o cosmos. Esses achados ajudam a reconstruir as práticas culturais, as crenças espirituais e as estruturas políticas que moldaram uma das cidades mais influentes do Hemisfério Ocidental.
Os ossos encontrados em Teotihuacán são mais do que vestígios arqueológicos; são mensagens de uma civilização que entendia os animais como mediadores entre o céu, a terra e o submundo. Dois milênios depois, eles continuam a contar histórias sobre como os teotihuacanos viam e moldavam o mundo ao seu redor.
Utilizamos cookies para oferecer uma melhor experiência de navegação. Ao navegar pelo site você concorda com o uso dos mesmos.
Saiba mais