Organizações não-governamentais entregaram na semana passada ao Senado uma carta aberta pedindo o fim do sigilo sobre a investigação do derramamento de petróleo que afeta o Nordeste.
A carta, que até o momento da entrega era assinada por cerca de cem organizações e pessoas físicas, como os atores Marcos Palmeira, Maitê Proença, Mateus Solano e vários cientistas, repudia a falta de transparência na apuração das causas do desastre e pede a abertura dos dados sobre a apuração e as ações do governo para conter o óleo.
Os ambientalistas também lembram que, até agora, o Plano Nacional de Contingência para incidentes com petróleo, de 2013, “não foi executado e/ou acionado na forma proposta”.
Na última quinta-feira (17), o Ministério Público Federal entrou com ação contra a União pelo não acionamento do plano, determinando que este ocorra em 24 horas. O comitê executivo do Plano Nacional de Contingência, que seria o responsável pelo acionamento, foi extinto em abril pelo “revogaço” do governo federal.
Também na quinta, o presidente da Comissão de Meio Ambiente do Senado, Fabiano Contarato (Rede-ES), pediu que o governo decretasse emergência ambiental pelo desastre. O óleo já afeta 2.250 km de costa no Nordeste brasileiro, do Maranhão a Salvador. Segundo o balanço mais recente do Ibama, divulgado nesta segunda (21), o óleo já atingiu 200 localidades em 78 municípios de todos os 9 estados do Nordeste.
Segundo o chefe do Estado-Maior do Comando de Operações Navais da Marinha, Alexandre Rabello de Faria, este é o maior desastre desse tipo já ocorrido no Brasil, tanto em extensão de dano quanto em duração. Desde o dia 2 de setembro, segundo a Marinha, foram recolhidas mais de 600 toneladas de resíduos contaminados com óleo nas praias nordestinas – voluntários, entidades da sociedade civil e autoridades governamentais trabalham na limpeza das praias afetadas.
A recomendação da Secretaria de Meio Ambiente e da Defesa Civil de Pernambuco é de que o óleo não seja manuseado sem o uso de equipamentos de segurança. Entidades envolvidas no esforço de limpeza, como o Greenpeace, reclamam que o governo não acionou o plano de emergência a tempo e da forma correta para combater o óleo. Os grupos de limpeza e governos estaduais pedem maior apoio com verbas federais, tratores e equipamentos de segurança.
Na quarta passada (16), a Associação dos Servidores do Ministério do Meio Ambiente publicou uma carta na qual afirma que a tragédia no Nordeste é sintomática do que virou o MMA: “Um órgão sem gestão e planejamento estratégico (…), totalmente centralizado (…) onde os servidores são silenciados e o conhecimento técnico não é levado em conta”.
Os primeiros relatos de praias nordestinas contaminadas por petróleo ocorreram no final de agosto na Paraíba e foram tratados como um incidente local. Nas últimas semanas, porém, o óleo se espalhou pelos nove Estados da costa nordestina, afetando algumas das principais destinações turísticas do país, como Jericoacoara (CE), Praia dos Carneiros (PE), Maragogi (AL) e Praia do Forte (BA).
Na quarta-feira, após 24 horas sem registro de novo óleo, uma mancha de grandes proporções foi avistada em Japaratinga, uma praia paradisíaca da Costa dos Corais, em Alagoas, próxima a um santuário de peixe-boi marinho, espécie ameaçada de extinção.
Ninguém sabe a origem do vazamento, embora estudos de modelagem feitos pela Universidade de São Paulo apontem para um navio a cerca de 400 km da costa, que teria ou afundado, ou sofrido um acidente, ou despejado intencionalmente uma carga de óleo bruto no mar. O comportamento da mancha, que se espalhou tanto para norte quanto para sul, sugere que o derrame tenha ocorrido na região onde a corrente Sul-Equatorial se bifurca.
No Senado, na quarta (17), o almirante Rabello de Faria comparou o derrame a uma “bala perdida” que se espalhou por toda a costa nordestina. “Agora estamos procurando a arma”. Mais de mil navios são investigados. A Marinha trata o incidente como crime, já que, em caso de acidente ou naufrágio, a obrigação do dono do navio é reportar às autoridades internacionais. É possível que o navio acidentado estivesse transportando petróleo comercializado ilegalmente.
Segundo a carta dos ambientalistas, o Estado brasileiro “pecou em não reconhecer de imediato a dimensão do problema” e “na falta de transparência pública e celeridade em tomar as devidas medidas emergenciais de contenção”.
“Passaram-se 39 dias entre o primeiro relato e a primeira agenda do ministro do Meio Ambiente relacionada com o petróleo”, disse o oceanógrafo Alexander Turra, do Instituto Oceanográfico da USP. Ele também critica o sigilo nas investigações. “Não consigo entender por que está sob sigilo uma investigação que é de interesse do Brasil, de algo que aconteceu fora das nossa zona econômica exclusiva”, afirmou.
O Ministério do Meio Ambiente foi procurado pelo Observatório do Clima para comentar a carta, mas não respondeu.
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