Paradoxo: espécies invasoras são ameaçadas em seus habitats nativos

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Espécies introduzidas por ações humanas enfrentam um dilema ambiental surpreendente: enquanto ameaçam ecossistemas em novas regiões, muitas estão sob risco em seus habitats de origem. Uma pesquisa liderada por cientistas das universidades de Viena e La Sapienza revela que o paradoxo da conservação envolve mais do que aparenta à primeira vista, exigindo escolhas complexas e estratégias globais.

Mamíferos como o rato marrom, o muflão e o vison, agora amplamente estabelecidos em territórios como a Europa Central, simbolizam essa dualidade. Introduzidos por humanos, eles podem causar desequilíbrios ecológicos, deslocando espécies nativas e disseminando doenças. Contudo, na região onde surgiram, enfrentam ameaças severas, muitas vezes impulsionadas por atividades humanas, como desmatamento e caça intensiva.

O estudo, publicado no periódico Conservation Letters, mapeou 230 espécies de mamíferos que se fixaram fora de seus territórios originais, revelando que 36 delas estão ameaçadas em seus habitats nativos. Casos emblemáticos como o macaco-de-crista, cuja população em Sulawesi caiu 85% desde 1978, contrastam com sua presença estável em ilhas vizinhas, mostrando a complexidade do cenário. O coelho selvagem também ilustra essa realidade: enquanto na Europa sua sobrevivência está comprometida, na Austrália, onde foi introduzido, sua população cresce de forma exponencial.

Esse paradoxo suscita uma questão fundamental: como tratar populações não nativas de espécies ameaçadas em sua origem? Deveriam ser combatidas por seus impactos nos ecossistemas locais ou protegidas como possíveis salvaguardas contra a extinção global? A pesquisa indica que considerar populações invasoras nas avaliações de risco global pode melhorar o status de conservação de algumas espécies, embora também traga desafios, como o redirecionamento de recursos e atenção para longe de suas áreas nativas.

A maior concentração de espécies ameaçadas nativas ocorre na Ásia tropical, região duramente afetada pela perda de florestas e exploração predatória. Para algumas espécies, populações introduzidas podem representar a última esperança de sobrevivência. No entanto, sua presença em novas áreas frequentemente resulta em impactos negativos sobre espécies locais, agravando problemas ecológicos.

Ao integrar populações não nativas nas análises de risco de extinção, o estudo apontou que 22% das espécies analisadas poderiam ver seu risco global reduzido. Ainda assim, os pesquisadores alertam que a prioridade deve ser proteger essas espécies em seus habitats originais, onde o impacto ambiental das extinções pode ser mais profundo.

Esse cenário reflete as marcas da globalização nos ecossistemas e impõe à conservação da natureza um desafio intrincado: equilibrar a preservação de espécies ameaçadas com a mitigação dos danos causados por sua introdução em novos ambientes. É um lembrete de que as ações humanas moldam profundamente o destino da biodiversidade e que a tomada de decisões nesse campo demanda análises amplas, sensíveis às especificidades locais e globais.

Stella Legnaioli

Jornalista, gestora ambiental, ecofeminista, vegana e livre de glúten. Aceito convites para morar em uma ecovila :)

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