Senadores e deputados federais responderam a questionário e também tiveram votações e discursos analisados. Além disso, foram criados três índices. Pesquisa será divulgada nesta quinta-feira (23.09) em painel da RAPS na Climate Week, que antecede a COP 26
- O novo Índice Ambientalista dos Congressistas (IAC) aponta grandes diferenças na preocupação com meio ambiente e clima entre parlamentares da situação e da oposição. Numa escala de 0 a 1, sendo 1 muita preocupação com o tema, congressistas da base de apoio ao governo pontuam menos (0,46) do que a média da oposição (0,85);
- Maioria afirma não enxergar dilema entre conservação ambiental e crescimento econômico, diz se preocupar com questões ambientais, mas ao mesmo tempo destaca que não vê interesse de colegas em avançar sobre o tema;
- Para eles, somente 15% do eleitorado brasileiro se mostra muito interessado na agenda ambiental. O achado destoa de pesquisa recente da Universidade de Yale, nos Estados Unidos, que mostra que 80% dos brasileiros entrevistados se declara muito preocupado com o meio ambiente.
- 87% acreditam que Brasil deve investir mais recursos para reduzir o desmatamento, e 69% concordam com um orçamento mais robusto para o Ibama, que sofreu consideráveis contingenciamentos nos últimos anos.
- Projetos vindos do Executivo têm maior chance de serem aprovados dos que projetos apresentados pela oposição.
Pesquisa inédita realizada com senadores e deputados federais evidencia que o alinhamento político de apoio ou oposição ao Governo Federal é um elemento-chave no posicionamento sobre as questões relacionadas à agenda do clima no Congresso Nacional. O estudo “A agenda do clima no Congresso Nacional: uma pesquisa sobre a percepção dos parlamentares brasileiros“ é uma iniciativa inédita da Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (RAPS), com apoio do Instituto Clima e Sociedade (iCS) e em parceria com o Centro de Política e Economia do Setor Público da Fundação Getulio Vargas (Cepesp/FGV), e será apresentada nesta quinta-feira (23.09), às 19h30, em evento da RAPS na Climate Week, que antecede as discussões da COP 26, a conferência mundial do clima, que será realizada em novembro, na Escócia.
A pesquisa, por exemplo, fez alguns testes com os parlamentares para compreender as chances de aprovação de um projeto sobre o meio ambiente caso ele fosse proposto pelo Governo Federal ou por algum representante da oposição. Os resultados apontam que as chances são muito maiores quando a medida vem do Executivo. Entre os parlamentares governistas, 60% aprovariam um Projeto de Lei que propusesse a declaração de emergência climática caso fosse uma iniciativa do Executivo, mas apenas 37% o fariam se a proposta fosse de um partido da oposição.
Os resultados da nova pesquisa também apontaram para dissonância entre o discurso e a prática dos parlamentares: embora a maioria (94%) dos parlamentares se diga muito interessada ou interessada nos temas ambientais e da agenda do clima, o Índice Ambientalista dos Congressistas (IAC), composto por duas dimensões – uma sobre a urgência climática e outra sobre os investimentos para fiscalização ambiental – ficou em 0,64, com variações relevantes na comparação entre a base governista (0,46) e a oposição (0,85). O IAC varia de 0 a 1, em que 1 indica o deputado mais preocupado e 0 é o valor conferido ao menos preocupado com as problemáticas ambientais e climáticas.
A pesquisa está dividia em três grandes blocos: (1) survey, respondida por 17 senadores, 114 deputados federais e 28 assessores diretos; (2) análise de 1.472 discursos de parlamentares sobre temas relacionados à agenda do clima e de votações nominais de 530 deputados em cinco proposições legislativas; (3) três índices.
“A despeito de estarmos vivendo uma emergência climática, parte importante do Congresso Nacional está no que poderíamos chamar de letargia climática, alheia à gravidade da situação”, afirma Mônica Sodré, diretora executiva da RAPS. Ela destaca que o Brasil é hoje o quinto maior emissor mundial de gases de efeito estufa (GEE) e, diferentemente de outros países, boa parte das nossas emissões (em torno de 44%,) advém de mudança no uso da terra e de desmatamento. Apesar disso, a maioria dos congressistas (51%) considera que o investimento em energias renováveis é prioritário na agenda do clima, enquanto apenas 29% deles optam por maior fiscalização dos desmatamentos.
“O parlamento está dando uma contribuição muito ruim a essa agenda, aprovando projetos de lei que podem implicar em mais desmatamento, aumento da grilagem e flexibilização de licenciamento para muitas atividades. Embora a fiscalização seja atribuição do Executivo, o parlamento federal tem se mostrado conivente com uma agenda do passado. Precisamos que o Congresso atue para nos colocar na agenda econômica do século 21, a da descarbonização”, afirma Sodré.
Índice ambientalista dos congressistas (IAC)
Para medir comportamento e percepção dos parlamentares, foram criados três índices inéditos, que variam de 0 a 1: o Índice Ambientalista dos Congressistas (IAC), que traz uma média a respeito dessa agenda; o Índice do Senso de Urgência Climática; e o Índice de Defesa a Investimentos para Fiscalização Ambiental.
Os números mostram que a média dos parlamentares preocupados com o meio ambiente ficou em 0,64, com uma variação grande entre os que apoiam o governo (apenas 0,46), e a média da oposição (0,85). Ainda segundo o IAC, políticos autoposicionados como à esquerda são mais preocupados (0,88) que os de centro (0,58) ou de direita (somente 0,3).
No índice específico sobre o senso de emergência climática dos parlamentares, a opinião média dos deputados e senadores fica em 0,59. Essa pontuação é muito maior entre oposicionistas (0,85) do que entre governistas (0,49). Houve diferença, também, na divisão do resultado por ideologia: 0,35 para parlamentares de direta, 0,59 para os do centro, e 0,85 para os de esquerda.
Quando falamos em investir na fiscalização ambiental, a posição média dos parlamentares fica em 0,77, mas a diferença entre o bloco governista (0,72) e o de oposição (0,91) é menor. Isso aponta que os parlamentares do bloco governista se mostram favoráveis à fiscalização com mais frequência do que concordam com a existência de uma emergência climática. Também nesse índice houve diferença entre as posições ideológicas: direita com 0,63, centro com 0,79 e esquerda com 0,9.
Pesquisa de opinião e análise das votações
A pesquisa survey mostrou que maioria dos entrevistados (98%) entende como falsa a dicotomia entre crescimento econômico e conservação ambiental, que 49% dos deputados e senadores se dizem muito interessados por essas questões, mas também destaca que os mesmos parlamentares acreditam que apenas 7% de seus colegas de Congresso estão muito interessados.
Outra dissonância notável está na percepção dos parlamentares sobre a preocupação dos eleitores. Para eles, somente 15% do eleitorado se mostra muito interessado na agenda ambiental. O achado destoa de pesquisa recente da Universidade de Yale, nos Estados Unidos, que mapeou a percepções da população sobre a crise climática em 30 países, mostrando que 80% dos brasileiros entrevistados se declara muito preocupado com o meio ambiente.
Além da pesquisa de opinião, o estudo se debruçou na forma como os parlamentares votaram e se posicionaram publicamente em torno da agenda ambiental para calcular os índices inéditos. A análise mostra que houve mais discursos com menções a termos relacionados à agenda do clima e ao meio ambiente no segundo semestre de 2019, período em que o Executivo Federal criticou os dados do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). Também houve destaque em junho de 2021, quando Ricardo Salles, então ministro do Meio Ambiente, foi exonerado.
Em relação às votações dos congressistas, foram selecionados dois projetos de lei (PL 3.261/2019 e PL 5.028/2019) e três medidas provisórias (MPV 867/2018, MPV 870/2019 e MPV 886/2019). De forma geral, a análise dos resultados mostra correlação entre ideologia e posicionamento estratégico dos partidos em relação ao governo: em uma ponta está o menor alinhamento com o governo, com os deputados do PSOL. No outro extremo, o partido Novo apresentou forte alinhamento à orientação do governo.