Por André Julião em Agência FAPESP | Desde 2012, o agrônomo Pablo Forlan Vargas, professor da Faculdade de Ciências Agrárias do Vale do Ribeira da Universidade Estadual Paulista (FCAR-Unesp), em Registro, percorre boa parte da região, no sul do Estado de São Paulo, além dos municípios de Vera Cruz, Botucatu, Jaboticabal e Ilha Solteira, em busca da batata-doce perfeita.
Algo próximo da perfeição, no caso, era uma planta de fácil cultivo, resistente a pragas e seca, com boa conformação (oval, não muito fina), com bastante massa seca (que não derrete quando cozida) e, principalmente, que tivesse altos níveis de betacaroteno, pigmento de cor alaranjada que é precursor da vitamina A, um nutriente que andava em falta nas crianças do Vale do Ribeira quando o projeto começou.
Onze anos depois, período em que teve três auxílios da FAPESP e firmou uma parceria com a unidade de Moçambique do Centro Internacional da Batata, o pesquisador lança três variedades (cultivares) mais ricas em carotenoides, como o betacaroteno, do que a variedade comercial disponível no Brasil conhecida por ter os maiores níveis desse pigmento.
O evento oficial de lançamento dos cultivares ocorreu em 8 de maio, no auditório do Centro de Raízes e Amidos Tropicais (Cerat) da Unesp, em Botucatu, onde Vargas é pesquisador associado. As plantas serão cultivadas e distribuídas gratuitamente para produtores, a maior parte pequenos proprietários de terra que plantam para subsistência ou para a venda em pequena escala.
“Essa é uma tecnologia que estamos transferindo para a sociedade. São variedades de fácil cultivo e alta produtividade, que demandam um manejo simples, mas que possivelmente serão mais produtivas à medida que mais cuidados forem tomados”, explica Vargas, destacando que grandes produtores também devem se beneficiar com a tecnologia.
Atualmente, o pesquisador conta com um novo apoio da FAPESP. Depois daquele primeiro projeto, teve outro financiado pela Fundação.
Biofortificada
As análises de carotenoides foram lideradas por Maria Isabel Andrade, do Centro Internacional da Batata em Moçambique. Há mais de 20 anos, a pesquisadora realiza cruzamentos e seleção de batatas-doces a fim de criar variedades ricas em carotenoides.
O trabalho rendeu a ela e sua equipe, em 2016, o World Food Prize, prêmio internacional que reconhece indivíduos que contribuíram para o avanço do desenvolvimento humano ao aprimorar a qualidade, quantidade e disponibilidade de alimentos no mundo.
Andrade também forneceu variedades para a coleção depositada no centro, que se somaram às plantas coletadas no Estado de São Paulo. Após analisar os teores de carotenoides, foram selecionadas 25 variedades mais ricas, que foram então cultivadas para que se medisse outras características, como conformação, produtividade, resistência a seca, a pragas etc.
“Este centro, que tem sede em Lima [Peru], e unidades em outros países, tem uma expertise imensa no assunto. Percebemos que, para chegar a um resultado rápido a ponto de impactar aquelas localidades que estávamos visitando, precisávamos da ajuda de profissionais, como a professora Maria Isabel Andrade”, conta o pesquisador.
Na comparação com a variedade Beauregard, desenvolvida nos anos 1980 nos Estados Unidos e rica em carotenoides, disponível no Brasil, as três campeãs da pesquisa brasileiro-moçambicana superaram em muito os níveis do pigmento.
Uma das três cultivares teve medidos 112,49 microgramas de carotenoides por grama, 88% a mais do que os 59,58 microgramas por grama encontrados na Beauregard. Nas outras duas cultivares, as análises mostraram 105,04 e 70,41 microgramas por grama, também bastante superiores ao tubérculo norte-americano.
A ausência da vitamina A contribui para problemas como cegueira, diarreias, desordens do sistema imune e mortes prematuras de recém-nascidos e mulheres grávidas. Com os resultados do estudo, espera-se trazer uma fonte barata desse nutriente e reduzir a ocorrência de tais mazelas.
Todos os anos, a equipe de Vargas participa da Feira de Troca de Sementes e Mudas Quilombolas do Vale do Ribeira. No evento, os moradores trocam sementes, ramas e mudas de diferentes culturas entre si, como forma de manter a diversidade de espécies alimentícias na região.
Agora, além de oferecerem as batatas-doces coletadas na própria região pelos pesquisadores, será disponibilizada também uma “prima” do continente vizinho para enriquecer a dieta dos paulistas.
Este texto foi originalmente publicado pela Agência FAPESP de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original. Este artigo não necessariamente representa a opinião do Portal eCycle.
Utilizamos cookies para oferecer uma melhor experiência de navegação. Ao navegar pelo site você concorda com o uso dos mesmos.
Saiba mais