O piretroide é um composto sintético que imita de forma potente as piretrinas encontradas nas plantas do gênero crisântemo e tanacetum. Presente em coleiras antipulga, inseticidas, shampoos contra piolhos, agrotóxicos, removedores de lodo e repelentes, o piretroide imobiliza e mata os insetos. O problema é que ele também pode ser nocivo para pessoas e animais não-alvos, como as abelhas.
Esse composto sintético surgiu no início dos anos 80 como uma alternativa aos agrotóxicos de maior potencial, tendo a função de combater e controlar pragas. De acordo com a Agência de Proteção Ambiental dos EUA (EPA), as piretrinas e os piretroides afetam a função nervosa, imobilizando e, eventualmente, matando os insetos. Mas os produtos a base de piretroide também podem apresentar um risco de curto e longo prazo para os seres humanos.
Considerando que o piretroide pertence à classe de inseticida mais utilizada no mundo, é preciso ponderar sobre as vantagens do seu uso no controle geral de insetos e sobre os riscos à saúde que envolve a exposição dessa substância por indivíduos não-alvos.
Após 14 anos de pesquisa com 2.116 adultos que participaram de um estudo realizado pela Jama Internacional Medicine, chegou-se à conclusão de que a exposição a inseticidas à base de piretroide aumenta o risco de morte por todas as causas e, em específico, três vezes mais a chance de morrer de doenças cardíacas. Os cientistas levaram em conta outros fatores que podem ter influenciado os resultados, incluindo dieta, nível de atividade física, tabagismo, ingestão de álcool, educação e renda.
Mas essa não foi a primeira vez que esses inseticidas foram analisados. Uma pesquisa da Agência de Proteção Ambiental dos EUA mostrou que o número de problemas de saúde em humanos – incluindo reações graves – atribuídos à piretrina e ao piretroide é significativo. Uma revisão de mais de 90.000 relatórios de reações adversas apresentados à EPA por fabricantes de pesticidas revelou que a piretrina e o piretroide representaram mais de 26% de todos os acidentes fatais, graves e moderados envolvendo o uso de pesticidas.
Segundo o relatório, pessoas morreram por exposição a esses produtos químicos, incluindo uma criança, depois que sua mãe lavou seu cabelo com um shampoo para tratamento de piolhos que continha piretrinas.
Mesmo um leve contato com esses inseticidas pode causar alguns efeitos colaterais a curto prazo. Eles podem causar prurido, queimação e irritação, de acordo com o Departamento de Saúde e Agência de Serviços Humanos para Registro de Substâncias Tóxicas e Doenças dos EUA. A exposição prolongada a quantidades maiores pode levar a tontura, náusea, dor de cabeça, vômito e perda de consciência. Mas, quanto aos efeitos a longo prazo, ainda não se sabe muito.
De todos os métodos de polinização (movimento da água, do vento, das borboletas, dos beija-flores; as técnicas artificiais; etc), as abelhas parecem deter os mais eficientes. Elas são rápidas, conseguem voar em ziguezague e, após um tempo com a colônia instalada, sabem qual é o melhor horário para coletar pólen.
Segundo a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO – na sigla em inglês), 70% das culturas de alimentos depende das abelhas. Esse dado, por si, nos revela a importância das abelhas para a humanidade. Isso sem contar os serviços ecossistêmicos de manutenção de outras formas vegetais, como florestas, que nos garantem, entre muitas coisas, água.
O problema é que, com frequência, as abelhas têm tido suas populações reduzidas por pressões de origem antrópica. Uma delas é o uso de agrotóxicos com substâncias nocivas às abelhas, como o piretroide. Diversos estudos (confira aqui: 1, 2, 3, 4) revelaram que piretroides empregados na agricultura podem ser fatais para as abelhas. Quando não aniquilam populações inteiras – mesmo em doses baixas – podem causar efeitos adversos como alteração no voo de retorno à colônia, hipotermia e efeito knock down (rápida paralisia).
Na agricultura, seu uso é justificado para aumentar a quantidade da colheita, pois combate o que, na linguagem convencional, chamamos de “pragas”. Largartas e percejos são exemplos comuns de pragas, pois consomem em um curto período de tempo grandes quantidades de vegetais que poderiam ser usados como produtos (commodities ou alimentos).
Entretanto, é preciso repensar o conceito de praga. Afinal de contas, todos os seres e vegetais são produtos de um ecossistema amplo, e surgem a partir de demandas e condições do próprio sistema biológico.
Já se sabe que as monoculturas, que são pobres em biodiversidade vegetal, são o cenário ideal para o aparecimento de pragas. Principalmente se elas estiverem instaladas em regiões próximas ao Equador, que concentram uma grande oferta de insetos. O resultado é um baquete de vegetais com insetos altamente especializados em devorá-los que não encontram nenhum obstáculos para tal.
Antes de tirarmos qualquer conclusão a respeito do banimento total do piretroide ou aprovar seu uso sem restrição, é preciso que haver um debate entre a sociedade civil, a comunidade científica, os produtores de alimento e os mercados de commodities. Nesse debate, questões norteadoras a serem pautadas poderiam ser: O combate a pragas justifica o uso de piretroides? Qual é o custo-benefício de combater mosquitos com piretroides? Não seria mais eficiente utilizarmos métodos de controle de pragas menos agressivos ou biológicos? Aumentar a agrobiodiversidade das culturas que alimentam as cidades seria uma alternativa para reduzir o uso de piretroides?
Muitos de nossos ancestrais conseguiram cultivar e extrair o necessário para o seu sustento mantendo a produtividade da terra a longo prazo – o que as monoculturas não fazem, pois comprometem a biocapacidade. Com esse plano de fundo, o quanto a sociedade moderna poderia aprender com os povos originários? Em um contraexemplo, aprendemos com outras civilizações – como as que habitavam a Ilha de Páscoa antes do ano de 900 – que o mau uso dos recursos naturais pode nos levar ao colapso ambiental. Nesse contexto, como o conjunto de pequenas decisões tomadas de forma errada poderia nos levar ao ecocídio e como as questões que envolvem o uso do piretroide se relaciona com o sistema total da Terra? Antes de apoiarmos políticas de liberação total de agrotóxicos e utilizarmos inseticidas de modo indiscriminado, vale a pena a reflexão.
Um estudo realizado pela Universidade do Noroeste mostrou que a planta Nepeta cataria, conhecida pelos nomes comuns de erva-gateira, erva-dos-gatos, gatária ou nêveda-dos gatos, pode ser considerada uma possível alternativa ao piretroide, componente nocivo à saúde humana presente nos repelentes.
“Os mosquitos, em particular aqueles que agem como vetores de doenças, estão se tornando um problema maior à medida que as mudanças climáticas criam condições atraentes para eles ao norte e ao sul do equador”, afirma o líder da pesquisa. “Os compostos derivados de plantas representam uma nova abordagem emergente para o desenvolvimento de repelentes de insetos, já que as plantas sempre souberam como se proteger das pragas de insetos.”
O pesquisador também acrescentou que repelentes derivados de plantas estão frequentemente disponíveis a um custo muito mais baixo e são mais fáceis de obter. A acessibilidade da Nepeta cataria pode ter grandes implicações nos países em desenvolvimento, onde as doenças transmitidas por mosquitos são um grande problema. No entanto, mais estudos precisam ser realizados para confirmar essas informações.
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