Por Agência Senado | Antes mesmo de chegar ao Senado, o Projeto de Lei (PL) 1.459/2022 — que revoga a atual Lei dos Agrotóxicos e altera as regras de aprovação e comercialização desses produtos químicos — ensejou manifestações dos senadores após aprovação em regime de urgência na Câmara dos Deputados, em fevereiro deste ano. Uma das matérias mais polêmicas em pauta na Comissão de Agricultura (CRA), o projeto passou por três audiências públicas, teve relatório lido duas vezes pelo relator, senador Acir Gurgacz (PDT-RO), pedido de vista coletiva e deliberação adiada em várias oportunidades.
A matéria põe em posição antagônica ruralistas e ambientalistas. Isso porque o PL 1.459 é resultado de muitas alterações promovidas ao longo de mais de duas décadas de tramitação no Congresso. O projeto original, PLS 526/1999, foi apresentado há 23 anos pelo então senador Blairo Maggi.
Enquanto a primeira proposta tinha por objetivo alterar a Lei dos Agrotóxicos (Lei 7.802, de 1999) em apenas dois itens, o texto atual revoga por completo a legislação vigente, apresentando 67 novos artigos.
A atual proposta é resultado da relatoria do deputado Luiz Nishimori (PL-PR), que em seu texto dispõe sobre pesquisa, experimentação, produção, comercialização, importação e exportação, embalagens e destinação final e fiscalização desses produtos. No Senado, o relator e presidente da CRA, senador Gurgacz, propôs poucas alterações ao texto.
Os senadores ruralistas defendem modernização dos produtos em utilização no mercado, maior agilidade na aprovação das solicitações e combate ao cartel de empresas que dominam o mercado.
Já os ambientalistas levantam não somente preocupações com o meio ambiente — a partir da liberação mais rápida de novos produtos e outros existentes no mercado —, mas principalmente com a questão da saúde humana, visto que o projeto flexibiliza algumas exigências, como quando suaviza e generaliza ao apenas definir como proibido o registro de pesticidas, de produtos de controle ambiental e afins que apresentem risco inaceitável para os seres humanos ou meio ambiente.
Na legislação vigente, está expressamente proibido o registo de produtos com substâncias consideradas cancerígenas ou que induzam deformações, mutações e distúrbios hormonais.
Vários senadores, entre eles, Eliziane Gama (Cidadania-MA), Fabiano Contarato (PT-ES), Paulo Rocha (PT-PA), Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Humberto Costa (PT-PE) e Jaques Wagner (PT-BA), questionam a promoção de debates somente na CRA, e não nas comissões de Meio Ambiente (CMA), Assuntos Sociais (CAS) e de Direitos Humanos (CDH) tendo em vista o alcance do projeto.
Consultor legislativo na área de agricultura, Henrique Pinto explica que “a apresentação dos aspectos sensíveis e que podem causar retrocessos à legislação vigente e a violações a dispositivos constitucionais são corroborados em manifestações contrárias à aprovação do PL 1.459” por parte de instituições de pesquisa, sociedades científicas, órgãos técnicos das áreas de saúde e ambiente, e da sociedade civil organizada, incluindo a plataforma #ChegaDeAgrotóxicos, que reuniu mais de 1,7 milhão de assinaturas. Há inclusive 25 notas técnicas reunidas em publicação que analisa a proposição.
— Em resumo, essas entidades apontam o aumento de consumo de agrotóxicos no Brasil (aumento de 190% nos últimos dez anos), os efeitos deletérios do uso intensivo de agrotóxicos ao meio ambiente, como poluição, contaminação de mananciais, do solo, do ar, além do risco de intoxicação de trabalhadores rurais e da população em geral. Os efeitos sobre a saúde humana associados à exposição aos agrotóxicos incluem intoxicações crônicas, caracterizadas por malformações, neurotoxicidade, desregulação hormonal, entre outros — enumera o consultor.
Pinto lembra que no dia 9 de março ocorreu evento público denominado “Ato pela Terra”, em Brasília, com artistas, representantes de povos indígenas e personalidades públicas protestando contra projetos de leis considerados maléficos ao meio ambiente, entre eles o PL dos Agrotóxicos.
Na contramão está nota técnica da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), segundo o consultor:
— A Embrapa defende a proposição por representar, entre outros, um marco regulatório previsível e funcional, que venha a contribuir para um ambiente juridicamente seguro, o que pode resultar em maiores investimentos em inovação e segurança. Alega que o processo de registro de pesticidas é moroso devido à excessiva burocracia, sendo necessária a simplificação do registro contemplada na proposta, além da centralização das ações procedimentais de registro junto ao Ministério da Agricultura (Mapa).
Quanto à análise de risco, diz Pinto, a Embrapa defende que se trata de metodologia utilizada na maioria dos países desenvolvidos, considerando a exposição ao pesticida e não apenas suas características intrínsecas.
Na última terça-feira (29), o relator e presidente da CRA, senador Gurgacz, atendeu a apelos de alguns senadores e adiou mais uma vez a votação do projeto. Ele concordou em discutir o texto naquela tarde com membros das comissões de transição de agricultura, saúde e meio ambiente do governo federal eleito.
— Mais uma vez, estamos ampliando o debate e vamos buscar um acordo que viabilize a votação da matéria. O PL 1.459 atualiza e moderniza a legislação sobre os pesticidas, criando um sistema de gestão integrado, coordenado pelo Ministério da Agricultura, mantendo as atribuições técnicas do Ibama [Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis] e da Anvisa [Agência Nacional de Vigilância Sanitária] — afirmou Gurgacz após a reunião.
Este texto foi originalmente publicado pela Agência Senado de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original. Este artigo não necessariamente representa a opinião do Portal eCycle.
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