Pesquisadores acreditam que lixo oceânico atingiu ponto de não retorno – com efeitos que, talvez, não não sejamos mais capazes de reverter
De acordo com um novo estudo, publicado na última sexta-feira na revista científica Science, a quantidade de plástico nos oceanos atingiu o que os cientistas chamam de “ponto de não retorno”, em que seus efeitos não podem ser mais revertidos.
Apesar da maior conscientização pública a respeito da poluição por plásticos, a pesquisa afirma que o investimento em processos de reciclagem não estão dando conta de reduzir a extensão do problema. Nossa última chance, segundo a equipe, é limitar a produção de plásticos e proibir a exportação de resíduos.
Ao jornal The London Economic, Matthew MacLeod, professor da Universidade de Estocolmo e principal autor do estudo, explicou que o plástico está profundamente enraizado em nossa sociedade. Ao ser descartado, ele escapa para o meio ambiente em todos os países – mesmo naqueles que contam com boa infraestrutura de tratamento de resíduos.
O plástico já é encontrado em todos os lugares do planeta: de desertos e topos de montanhas a oceanos profundos e neve do Ártico. Em 2016, as estimativas de emissões globais para os lagos, rios e oceanos do mundo variaram de nove a 23 milhões de toneladas métricas por ano. A mesma quantidade de lixo é despejada de volta para a terra firme. Para piorar, espera-se que esses números cheguem perto de dobrar até 2025, se mantido o atual cenário.
Mine Tekman, coautora do estudo e estudante de PhD no Alfred Wegener Institute, em Bremerhaven, na Alemanha, aponta que a poluição por plásticos é também uma questão “política e econômica”. Para ela, as soluções atuais, como tecnologias de reciclagem e limpeza de resíduos, não são suficientes. Por isso, devemos atacar o problema na raiz.
“O mundo todo tem promovido soluções tecnológicas para reciclar e retirar o plástico do meio ambiente. Como consumidores, acreditamos que, se separarmos adequadamente nosso lixo plástico, tudo será magicamente reciclado. Mas não é bem assim”, afirma Tekman.
“Tecnologicamente, a reciclagem de plástico tem muitas limitações, e países com boas infraestruturas têm exportado seus resíduos de plástico para países com piores instalações. Reduzir as emissões requer ações drásticas, como limitar a produção de plástico virgem para aumentar o valor do plástico reciclado e proibir a exportação de resíduos, a menos que seja para um país com melhor infraestrutura de reciclagem”, acrescenta a pesquisadora.
Acumulação
O plástico se acumula no ambiente e nos oceanos quando a quantidade de resíduos excede o número de material removido por iniciativas de limpeza e pela degradação natural, por meio de luz solar, ar e umidade.
Hans Peter Arp, professor da Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia, em Trondheim, e também coautor do estudo, explica: “A degradação do plástico ocorre por muitos processos diferentes, e já percorremos um longo caminho para compreendê-los. No entanto, o intemperismo está mudando constantemente as propriedades da poluição do plástico, o que abre portas para novas perguntas”.
Arp afirma que a degradação natural é muito lenta e, por isso, não é eficaz para interromper o acúmulo no ambiente. Ele descreve o plástico como um “poluente pouco reversível”, tanto por suas emissões contínuas como por sua persistência ambiental.
Lugares intocados, como as regiões polares, são os mais vulneráveis. Isso porque, em ambientes remotos, os resíduos não podem ser removidos por meio de limpezas organizadas.
“O desgaste de grandes itens de plástico inevitavelmente resultará na geração de um grande número de partículas micro e nanoplásticas, bem como na lixiviação de produtos químicos adicionados intencionalmente e outros produtos químicos que quebram a estrutura do polímero plástico”, explica a professora Annika Jahnke, da Universidade Técnica de Aachen, na Alemanha.
“Portanto, o plástico no ambiente é um alvo em constante movimento de complexidade e mobilidade crescentes. Entender onde ele se acumula e quais efeitos pode causar é um desafio – e talvez seja impossível de prever”, acrescenta.
Além dos danos que causa pelo emaranhamento de animais e efeitos tóxicos, há uma série de potenciais impactos ambientais indiretos.
Eles incluem o agravamento das mudanças climáticas e a perda de biodiversidade nos oceanos, onde o plástico atua como um estressor adicional para a sobrepesca. Vale destacar também a destruição contínua de habitats, em virtude de alterações na temperatura da água, redução de nutrientes e maior exposição a produtos químicos.
Os pesquisadores esperam que a soma de todas as descobertas forneça uma “motivação convincente” para ações eficazes e contínuas.
O professor MacLeod acrescenta: “No momento, estamos sobrecarregando o meio ambiente com quantidades crescentes de poluição por plástico pouco reversível. E, até agora, não vimos evidências generalizadas de consequências ruins. No entanto, se a presença de microplásticos no ambiente provocarem efeitos realmente graves, provavelmente não seremos capazes de revertê-los”.
Para ele, o custo de ignorar o acúmulo de poluição por plásticos pode ser enorme. Por isso, a medida mais racional a se tomar é agir o mais rápido possível para reduzir as emissões desse material para o meio ambiente.
1,3 bilhão de toneladas
No ano passado, um estudo britânico publicado também na revista Science revelou que 1,3 bilhão de toneladas de plástico vão se acumular no meio ambiente, tanto em terra quanto no oceano, até 2040.
A descoberta da Universidade de Leeds foi baseada em um modelo global da escala do problema do plástico nas duas décadas seguintes.
Outro estudo recente da Universidade de Plymouth descobriu que 700 espécies diferentes estão ameaçadas pela poluição do plástico – muitas das quais estão em risco de extinção.
No início deste ano, o Greenpeace instou o governo do Reino Unido a proibir a exportação de resíduos de plástico para todos os países, investir em uma indústria de reciclagem doméstica e definir uma meta obrigatória para a redução do plástico.
A organização também revelou como os resíduos de plástico de sete grandes supermercados do Reino Unido estavam sendo queimados e despejados na Turquia, em vez de serem reciclados. Ela reivindica que os ministros proíbam todas as exportações de plástico até 2025.