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Pesquisador brasileiro é o primeiro autor de investigação sobre plástico acumulado em corais tropicais ao redor do mundo, que é capa da consagrada revista Nature

Por Ivan Conterno em Jornal da USP | Hudson Tercio Pinheiro, do Centro de Biologia Marinha (Cebimar) da USP, é o primeiro autor do artigo que é capa da prestigiada revista Nature com o resultado de 1231 análises subaquáticas que quantificaram o lixo depositado nos recifes de corais. Grande parte das imersões foram feitas na zona mesofótica, que fica entre 30 e 150 metros abaixo da água. O pesquisador visitou 52 ecossistemas de recifes do mundo durante seis anos e outros 32 locais foram visitados por pesquisadores parceiros no mesmo período.

O extenso trabalho passou por 14 países que contornam o planeta identificando o tipo de lixo encontrado em recifes de coral. “Incrivelmente nós encontramos maior quantidade de lixo dos ambientes mais profundos. Isso não era esperado”, conta Hudson ao Jornal da USP. Antes, imaginava-se que esses ambientes seriam refúgios viáveis para a vida marinha diante da poluição nas superfícies.  

Além do esforço humano para a remoção do lixo nos recifes rasos, a menor quantidade de lixo nesses locais pode ser explicada pela força das ondas, que levam as peças de plástico tanto para o mar aberto quanto para as profundezas do oceano. O lixo plástico ficaria preso nos corais da zona mesofótica, que forma a última barreira antes da acumulação no fundo do mar. Outra explicação seria o fato dos corais mais rasos crescerem rapidamente ao ponto de cobrirem parte da poluição.

Diferente do que foi observado nos recifes profundos, no lixo plástico encontrado em outros ecossistemas marinhos próximos aos litorais predominam as embalagens ,e essa proporção diminui conforme a profundidade aumenta.

Os cientistas encontraram lixo em 77 dos 84 recifes estudados, sendo o plástico o material mais abundante, somando 88%. A única exceção foram as áreas exteriores de Seicheles, país africano formado por ilhas no Oceano Índico, ao Norte de Madagascar, embora haja registros anteriores de lixo também nesses locais.

Nem mesmo os corais próximos às ilhas mais remotas e quase intocadas do Planeta ficaram de fora.  Nos recifes das Ilhas Marshall, no Pacífico, foram encontrados de 581 a 1515 itens de plástico por quilômetro quadrado. Já em Comores, um arquipélago na costa sudeste da África, teve a maior densidade de poluição, com cerca de 8529 a 84495 itens de plástico por quilômetro quadrado.

A pesca é a principal ameaça. Quase três quartos de todos os itens de plástico (73%) documentados nos recifes são cordas, redes e linhas relacionadas a essa atividade. As redes de náilon presas nos corais criam a chamada pesca fantasma, quando peixes e outros animais são capturados por essas estruturas abandonadas e ficam ali apodrecendo.

Os pesquisadores modelaram as informações coletadas e constataram que há picos de poluição em locais próximos a populações humanas, grandes mercados e áreas protegidas. “A pescaria está concentrada no limiar de onde há proteção integral, onde não se pode pescar porque há um aumento na abundância de peixe ali”, explica Ronaldo Francini-Filho, professor do Cebimar que contribuiu com o tratamento dos dados.

A previsão é que a poluição plástica aumente em 40% antes de 2025. Atualmente, a acumulação desse material nos recifes de coral é estimada em pelo menos 11 bilhões de itens apenas nos recifes rasos da Ásia e do Pacífico. No entanto, a acumulação de plástico nos recifes mais profundos ainda é desconhecida. “Nós também mergulhamos com o submarino na parte mais profunda do mar e o que mais se via a 600 metros de profundidade numa ilha oceânica isolada no meio do Atlântico era lixo”, conta o professor. “O número total de fragmentos plásticos encontrados é relativamente pequeno pois são regiões relativamente isoladas.”

Os recifes de corais representam menos de 1% da cobertura do mar, mas abrigam cerca de 25% da biodiversidade marinha e metade de todas as espécies conhecidas de peixes. A poluição, porém, tem feito com que eles percam a capacidade de abrigar os animais marinhos e as algas.

Devido ao crescimento mais lento dos corais em condições de pouca luz, os recifes mais profundos têm menor capacidade de recuperação. A grande quantidade de plástico preso atua como um fator de perturbação permanente nos recifes de coral já danificados, como alerta Hudson. “Algumas pesquisas recentes mostram que a quantidade de plástico está associada também a doenças no ambiente recifal.”

Mergulhar em águas profundas não é tarefa fácil. A pressão da água é tanta que comprime órgãos como pulmões e ouvidos. A volta precisa ser lenta para evitar uma descompressão brusca que pode ser fatal. Para retornarem com segurança de uma pesquisa em recifes a 150 metros abaixo do nível do mar, os mergulhadores levam de cinco a seis horas, como detalha Hudson. “Você precisa conhecer muito bem os colegas. Há um treinamento muito intenso de resgate, de entender quando o outro está com problema e de saber as alternativas de ajudar uns aos outros”.

Hudson Pinheiro mergulhou a partir de 15 pontos do Atlântico e no Pacífico e contou com a colaboração de outros cientistas em outros dez. “Na Austrália foram os parceiros da James Cook University. No Índico, foram os colegas da Inglaterra que estudaram Seicheles e Comores.”

Cerca de 60% da área total investigada está na zona mesofótica, região onde pouca luz chega. Por ser uma tarefa de alto risco, os pesquisadores precisam de uma longa adaptação desde as águas mais rasas em que pesa a atividade em grupo. Para chegar a ambientes tão profundos, os pesquisadores usam um rebreather de circuito fechado, equipamento semelhante ao usado por astronautas. O aparelho recicla o oxigênio expirado e filtra o gás carbônico (CO2). Além dos mergulhos, os pesquisadores também usaram veículos submersíveis tripulados e não tripulados.

Os plásticos afetam o ambientes e também podem se acumular nos organismos na forma de microplásticos. Em março de 2022, a Organização das Nações Unidas (ONU) negociou a criação de um tratado global ainda a ser redigido. “É só a gente voltar 30 anos. Não é nada que a gente não saiba, que a gente já não tenha feito. O plástico substituiu materiais que foram utilizados ao longo de séculos: o vidro, o barro, o papel, a madeira”, desabafa Hudson Pinheiro.

Mais informações: e-mails htpinheiro@usp.br, com Hudson Pinheiro, e francinifilho@usp.br, com Ronaldo Francini-Filho.


Este texto foi originalmente publicado pelo Jornal da USP de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original. Este artigo não necessariamente representa a opinião do Portal eCycle.


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