Os cientistas estão expondo as inúmeras razões pelas quais o sudeste da Amazônia começou a liberar carbono – e porque é que toda a floresta pode estar a atingir um ponto de não retorno
Os ecossistemas terrestres do mundo absorvem juntos cerca de 30% do dióxido de carbono liberado pela queima de combustíveis fósseis; os cientistas pensam que a maior parte disto ocorre nas florestas, e a Amazônia é de longe a maior floresta contígua do mundo.
Entretanto, um estudo realizado pela climatologista brasileira Luciana Gatti, publicado recentemente na revista Nature, mostrou que o sudeste da Amazônia tornou-se uma fonte de CO2.
Desde 2010, a cientista coleta amostras do ar sobre a Amazônia em aviões para monitorar a quantidade de CO2 que a floresta absorve. Em 2021, ela comunicou dados de 590 voos que mostraram que a absorção da floresta Amazónica – o seu sumidouro de carbono – é fraca no sudeste da região.
Para Carlos Nobre, cientista climático do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo, no Brasil, a mudança estava acontecendo muito cedo. Em 2016, utilizando modelos climáticos, ele e os seus colegas previram que a combinação do desmatamento com as mudanças climáticas acabaria por levar a floresta amazônica para um “ponto de não retorno”, também chamado de savanização.
As observações de Gatti mostram os primeiros sinais do que ele previu, diz Nobre.
“O que prevíamos que aconteceria talvez em duas ou três décadas já está acontecendo”, diz Nobre, que foi um dos doze coautores do artigo com Gatti.
Viajei para Santarém, onde o rio Tapajós se junta ao rio Amazonas, para me juntar a Gatti e outros cientistas que tentam determinar se a floresta está caminhando para uma transformação irreversível em direção a uma forma degradada de savana.
Outra grande questão é se a floresta ainda pode ser salva através do abrandamento das alterações climáticas, da interrupção do desmatamento da Amazónia e da restauração das terras danificadas, algo que Nobre sugere ser possível.
O desmatamento em grande escala que vimos do ar é a ameaça mais visível à Amazônia. Mas a floresta está sofrendo de outras formas menos óbvias.
Erika Berenguer, ecologista da Universidade de Oxford e da Universidade de Lancaster, no Reino Unido, descobriu que mesmo a floresta intacta já não é tão saudável como era antes, devido a forças como as alterações climáticas e os impactos do agronegócio que ultrapassam as fronteiras agrícolas.
No início deste ano, uma grande equipa internacional de investigadores, incluindo Berenguer, relatou que tais mudanças estavam a ter efeitos em 38% da floresta amazônica intacta.
Gatti visitou Santarém pela primeira vez no final da década de 1990, quando a maior parte da agricultura nesta parte da Amazônia era praticada por pequenos agricultores para fins de subsistência. Agora, ela está surpresa com a escala de destruição que devastou a selva: “Estão matando a floresta para transformar tudo em soja”, relata a climatologista à Nature.