Os povos originários do Brasil são compostos de uma enorme diversidade. São 305 etnias indígenas vivas, somando quase 1.7 milhão de pessoas habitando o território brasileiro.
Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2022, esse valor representava menos de 1% da sociedade brasileira.
De acordo com o IBGE, 51.2% dos povos indígenas do Brasil estão concentrados nos territórios da Amazônia Legal. A Amazônia Legal é uma área formada pelos estados do Acre, Rondônia, Amazonas, Pará, Tocantins, Roraima, Amapá, Mato Grosso e parte do Maranhão. Ao todo, são 772 municípios brasileiros.
A Amazônia Legal é um recorte geográfico, formado na década de 1950. Dada sua importância, o objetivo era desenvolver, de forma sustentável, a região. Esse recorte engloba toda a Amazônia presente em território nacional, representando uma área de pouco mais de 5 milhões de quilômetros quadrados. Isso corresponde a quase 59% de todo o País.
O termo “indígena” quer dizer “originário, aquele que está ali antes dos outros”. Segundo pesquisadores, os ancestrais desses povos chegaram ao continente americano milênios antes de Cristóvão Colombo ou Pedro Álvares Cabral. Os primeiros povos a pisarem nas Américas vieram da Ásia há, pelo menos, 12 mil anos.
Uma série de estudos, coordenados pela bióloga e geneticista brasileira Tábita Hünemeier, mostra que os primeiros povos chegaram às Américas em mais de um fluxo migratório.
Inicialmente, os povos originários atravessaram da Sibéria para o Alasca. A travessia foi feita pela Beríngia, um pedaço de terra que submergiu, onde hoje é o Estreito de Bering. Essa região compreendia desde a cordilheira Verkhoyansk (ao leste da Sibéria, na Rússia) até o rio Mackenzie (maior bacia hidrográfica do Canadá).
Especialistas sugerem que a Beríngia passou a ser ocupada entre 15 mil e 13.6 mil AP (antes do presente), por povos conhecidos como Siberianos Antigos do Norte (ANS, da sigla em inglês). Geneticamente, os ANS apresentam semelhanças com os povos atuais do norte da Europa e também com os povos originários das Américas. Isso não acontece com outros povos euroasiáticos.
Antes do presente (AP) é uma forma de marcar o tempo, utilizada nos campos da arqueologia e geologia, por exemplo. Para fins de cálculo, o ano de referência usado pelos cientistas é 1950.
Sendo assim, a mistura genética dos ANS e de um povo do leste da Ásia pode ter formado, no mínimo, duas linhagens diferentes. Uma delas gerou os Paleo Siberianos antigos, ancestrais dos habitantes atuais da região nordeste da Sibéria. A outra linhagem gerou os ancestrais dos povos originários das Américas.
No entanto, durante o Último Máximo Glacial (UMG), que é o período glacial que ocorreu por volta de 20 mil anos atrás, a Beríngia não dava acesso às terras americanas, por conta de grandes geleiras continentais. Isso traz a possibilidade de migrações por rotas alternativas.
Uma das possibilidades é a travessia do oceano Pacífico. A outra, seria por meio de um corredor, livre de gelo, nas Montanhas Rochosas, na América do Norte, em diferentes períodos da história.
Além disso, após o período do UMG, os primeiros habitantes da América do Sul teriam chegado, vindos da América do Norte, em 15500 AP.
Outro estudo define que os povos originários brasileiros são geneticamente distintos dos povos originários da região da Cordilheira dos Andes. A colonização européia, a partir do final do século 15, que trouxe a escravidão de comunidades africanas, miscigenou a população nativa. O processo de miscigenação apagou parte da história dos povos originários. Isso torna ainda mais profunda a busca pelas origens dos povos indígenas na América do Sul.
Quando os portugueses desembarcaram, no fim do século 15, na região que hoje corresponde ao sul da Bahia, os povos indígenas já habitavam essa terra há muito tempo. Segundo estudiosos, haviam entre 2 e 5 milhões de indígenas vivendo no Brasil.
Em 2022, o censo realizado pelo IBGE mostrou que existem 305 etnias indígenas vivendo no País, que possuem 274 famílias linguísticas distintas. Entretanto, é estimado que existiam mais de 1000 etnias habitando o Brasil em 1500.
Segundo o Instituto Socioambiental (ISA), é essencial reconhecer alguns dos principais pontos relacionados aos povos indígenas.
O primeiro deles é o fato de que, quando os europeus chegaram, já existiam seres humanos habitando as terras brasileiras. Isso se estende a todo o continente americano.
Além disso, os termos “originários” e “nativos” reforçam exatamente esse fato: de que esses povos já estavam nessas terras, antes das ocupações européias. Ou seja, esses territórios não foram “descobertos” pelos europeus.
Ainda existem muitos descendentes dos primeiros povos, vivendo no Brasil. Esses povos, como tantos outros, tem sua própria cultura, resultado das interações humanas com o meio em que habitam. No entanto, a cultura indígena é forçosamente alterada pelo colonialismo cultural, ainda na atualidade.
Também é fundamental entender que, apesar de existirem fronteiras entre os países atuais, os povos indígenas que foram divididos por essas, já habitavam a terra muito tempo antes, fazendo parte de uma mesma comunidade. Um exemplo disso é o povo Yanomami, que se divide na região norte da Amazônia, entre Brasil e Venezuela.
Em relação às etnias, os povos indígenas foram batizados por antropólogos, funcionários da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), entre outros. Nem todos os nomes de etnias representam a forma como os próprios indígenas se autodenominam. Alguns são muito genéricos e outros nomes são depreciativos. Ainda assim, com projetos de educação indígenas, nos últimos anos, as próprias comunidades passaram a criar grafias próprias.
Um exemplo desse equívoco pode ser claramente representado pelos povos Kayapó. Kayapó, que significa “semelhante a macaco”, é um termo genérico da língua Tupi. No entanto, os povos Kayapó se autodenominam Mebêngôkre. A língua falada pelos Kayapó-Mebêngôkre não é Tupi e sim Macro-Jê.
Muitos povos indígenas no País ainda vivem de acordo com a cultura de seus ancestrais. Alguns misturam sua cultura com outras tradições culturais pós-colonialistas. Mas também existem povos isolados. É estimado que existam cerca de 100 povos indígenas que vivem isolados na floresta amazônica. Apesar de isolados, esses povos têm consciência de que outras sociedades os rodeiam.
De qualquer forma, todas as variações da população indígena têm uma coisa em comum: eles se reconhecem como parte da natureza e estabelecem com ela, um modo de vida sustentável, preservando toda a biodiversidade.
Um estudo, realizado em 2022, em conjunto pelo ISA e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), analisou características do manejo de áreas protegidas, ocupadas por populações tradicionais.
Os povos tradicionais têm características próprias e distintas, social, cultural e economicamente falando. São comunidades que mantêm um forte vínculo com o território que ocupam, trabalhando de forma sustentável, garantindo sua subsistência e respeitando o meio ambiente. Ao todo, são 26 povos e comunidades reconhecidos oficialmente, além dos povos indígenas e quilombolas.
Os pesquisadores reforçam que áreas com a presença de povos indígenas, territórios quilombolas, reservas extrativistas e ainda, reservas de desenvolvimento sustentável, protegem cerca de um terço das florestas brasileiras.
Considerando todos os biomas presentes no País, 42.3% das vegetações nativas são protegidas também pela ocupação dos povos tradicionais.
As regiões ocupadas por indígenas, quilombolas e Unidades de Conservação (UCs) protegem cerca de 40.5% de biomas florestais. Pouco mais da metade das florestas são protegidas por terras indígenas.
Segundo Tiago Moreira dos Santos, antropólogo do ISA, “os povos indígenas ajudam a ampliar a diversidade da fauna e da flora local porque têm formas únicas de viver e ocupar um lugar”.
O Relatório Anual de Desmatamento no Brasil, realizado pelo MapBiomas, mostra que houve um aumento de 22,3% no desmatamento, de 2021 para 2022. Nesse período, foram 76193 alertas de desmatamento comprovados. Isso significa que mais de 2 milhões de hectares de área nativa foram desmatados.
Mais de 50% do desmatamento ocorreu na Amazônia. Juntos, Amazônia e Cerrado, somaram 90,1% de área desmatada. Os estados mais afetados pelo desmatamento foram Pará, Amazonas e Mato Grosso.
O relatório reforça que a agropecuária é a maior responsável pelo desmatamento no Brasil. Cerca de 96% das áreas de florestas e vegetação nativa, que foram devastadas, se tornaram pastos ou lavouras.
Apesar de trazerem mais proteção para o meio ambiente, terras protegidas também são invadidas e sua vegetação é suprimida, desafiando a legislação. Terras indígenas, comunidades quilombolas, assentamentos rurais e UCs também viram suas terras atingidas pelo desmatamento. Juntos somam quase 20% da área total desmatada em 2022.
No entanto, o MapBiomas reforça que apesar do desmatamento ter aumentado, em terras indígenas essa prática diminuiu. Por outro lado, a maior parte dos alertas nesses territórios é na região amazônica.
Segundo o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), a diminuição do desmatamento ocorre pela proteção dos povos indígenas.
Nesse contexto, o Ipam analisou os impactos ambientais que o estabelecimento do marco temporal pode causar, principalmente no bioma da Amazônia.
Segundo a tese do marco temporal, os povos indígenas têm o direito apenas à terra que já ocupavam até 05 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição.
Isso é uma contradição a Teoria do Indigenato, um direito originário dos povos indígenas sobre as terras que ocupam. Esse é um direito anterior à criação do Estado brasileiro. Ao Estado caberia apenas demarcar e declarar os limites dos territórios.
O artigo 231, da Constituição brasileira, diz que “São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens”.
No entanto, com o estabelecimento do marco temporal, caso não possam comprovar que já ocupavam determinadas áreas antes de 1988, os povos originários podem ser expulsos de seus territórios. Além disso, o marco temporal também interrompe processos de demarcação de terras indígenas e revisa terras já homologadas.
O Ipam calculou os riscos causados ao meio ambiente, usando como base a taxa máxima de desmatamento, indicada pelo Código Florestal Brasileiro.
Considerado o aumento da grilagem e do desmatamento, principalmente em terras indígenas, o estudo apurou que a Amazônia Legal pode perder uma área de até 55 milhões de hectares de vegetação nativa. Ainda, atividades predatórias poderão causar a emissão de até 18.7 bilhões de toneladas de dióxido de carbono na atmosfera.
Os territórios indígenas também são importantes para a regulação do clima. Dentro da TI Xingu, por exemplo, a temperatura média é cerca de 5 °C menor do que no entorno, onde há áreas de vegetação suprimidas. Isso se repete em outras TIs, devido às florestas em pé nessas regiões.
O desmatamento contribui diretamente para o aumento da temperatura do planeta. Suas consequências podem ser sentidas, em forma de ondas extremas de calor ou pela diminuição das chuvas, além de outros fatores.
O MapBiomas mapeou 844 milhões de hectares da América do Sul e mostrou que 77% da área de vegetação natural que foi suprimida, se transformou em pastagens. Os dados são de dezembro de 2023.
Outro alerta importante mostra que a Amazônia já perdeu quase 27% de sua vegetação. A floresta chegou no seu limite para regeneração. Mais desmatamento impede que a floresta se recupere e faz com que a região se torne uma savana.
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