Povos tradicionais têm papel fundamental na preservação da agrobiodiversidade

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Conhecimento de culturas tradicionais são passadas de geração a geração e contribuem para a preservação da biodiversidade de plantas em determinadas regiões. Falta de variedade pode representar crise de alimentos

Preservar a biodiversidade no meio ambiente não se limita apenas a manter o equilíbrio ecológico e natural de determinada região. Trata-se de uma questão que se relacionada diretamente com a vida cotidiana e que, se não for levada a sério, pode trazer riscos gravíssimos para o ser humano.

Um exemplo antigo pode ajudar na explicação. No século XIX, uma praga agrícola acabou com as plantações de batata na Irlanda, causando a morte de mais  de um milhão de pessoas por fome. Muito disso ocorreu pelo fato de que apenas duas das mais de mil variedades de batatas existentes na América do Sul terem sido levadas para a Irlanda, no século XVI. A batata já era o alimento básico na Irlanda e em outros países da Europa. Biodiversidade limitada gerou problemas fatais para a população europeia daquela época.

Ao contrário do exemplo citado, pesquisadores notaram que, na região do alto e do médio Rio Negro, no Amazonas, existem mais de 100 variedades de mandioca, cultivadas há gerações por mulheres das comunidades indígenas. Elas costumam compartilhar experiências de plantio, chegando a experimentar dezenas de variedades em seus pequenos roçados ao mesmo tempo. Esse sistema foi registrado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), em 2010, como patrimônio imaterial do Brasil.

Levando-se em conta essa questão, foi anunciado, na reunião da Regional da América Latina e Caribe da Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços de Ecossistemas (IPBES, na sigla em inglês), ocorrida em julho de 2013, na sede da FAPESP, em São Paulo, um projeto cujo objetivo é estudar como as culturas tradicionais trabalham para preservar a biodiversidade das plantas.

Segundo uma das responsáveis pelo projeto Maria Manuela Ligeti Carneiro da Cunha, professora emérita do Departamento de Antropologia da Universidade de Chicago, nos Estados Unidos, e professora aposentada da Universidade de São Paulo (USP), “o projeto-piloto será um bom exemplo de como é possível a colaboração entre a ciência e os conhecimentos tradicionais e locais, capazes de dar grandes contribuições para a conservação da diversidade genética de plantas – um problema extremamente importante”.

Importância do conhecimento tradicional

Por morarem em áreas mais vulneráveis a mudanças climáticas e ambientais, esses povos tradicionais são dependentes dos recursos naturais. São capazes de perceber com maior sensibilidade as mudanças no clima, na produtividade agrícola ou na diminuição de número de espécies de plantas e animais. Esses conhecimentos minuciosos são fundamentais, já que grandes painéis de debate não conseguem aferi-los.

No mundo, há aproximadamente 30 mil espécies de plantas cultivadas, mas apenas 30 culturas são responsáveis por fornecer 95% dos alimentos consumidos pelos seres humanos. O arroz, trigo, milho, milheto e sorgo respondem por 60%.  Isso ocorre porque com a “Revolução Verde”, ocorrida logo depois da Segunda Guerra Mundial, houve uma seleção das variedades mais produtivas e geneticamente uniformes, em detrimento de plantas mais adaptadas às especificidades de diferentes regiões do mundo. Com isso, espalhou-se uma grande homogeneidade de cultivares ao redor do planeta – levando à perda de muitas variedades locais.

“Isso representa um enorme risco para a segurança alimentar porque as plantas são vulneráveis a ataques de pragas agrícolas, por exemplo, e cada uma das variedades locais de cultivares perdido tinha desenvolvido defesas especiais para o tipo de ambiente em que eram cultivadas”, contou Carneiro da Cunha. Essa erosão da diversidade genética das plantas cultivadas no mundo remete ao problema ocorrido na Irlanda, exemplificado no inicio do texto.

Crise de Alimentos

Esse estudo, além de ser ferramenta importante para a preservação da biodiversidade, ajuda na divulgação de informações e cria novas possibilidades e alternativas aos padrões atuais de produção em massa de alimentos.

Nesse sentido, o crescimento urbano e populacional tende a gerar enormes problemas ambientais e nutricionais. Segundo a ONU, o planeta terá cerca de nove bilhões de pessoas em 2050. Por isso, há pesquisas que garantem que, se continuarmos nesses padrões de produção estaremos fadados a uma crise mundial de alimentos no futuro.

Buscar alternativas é um dos passos para uma alimentação sustentável. Porém, em paralelo, é preciso que atuemos. Evitar o gasto desnecessário de alimentos, praticar exercícios físicos, diminuir o consumo de carne vermelha e dar preferência a alimentos orgânicos são pequenas colaborações importantes.

Fonte: FAPESP

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