Por WWF Brasil – Além de ações para proteger lideranças comunitárias, de campanhas de fomento à economia verde e de redução do desmatamento e de queimadas, uma parceria com o WWF-Brasil permitiu que a Fundação Viver, Produzir e Preservar (FVPP) elaborasse um mapa inédito dos conflitos agrários no oeste do Pará. Baseada em Altamira, a FVPP atua na região do Rio Xingu e da rodovia Transamazônica com a promoção do desenvolvimento sustentável em comunidades agroextrativistas e Terras Indígenas.
O projeto, batizado de Desenvolvimento com Justiça Socioambiental, tem o objetivo de apoiar ações de combate à grilagem de terras, conflitos agrários, desmatamento e queimadas, visando a proteção do território e o monitoramento de pressões ambientais e ameaças às lideranças locais. De acordo com Maria Aparecida Brandão, coordenadora de projetos da FVPP, esse trabalho conjunto teve início em abril de 2020, abrangendo 16 municípios. No oeste do Pará, salienta ela, há mais de 15,8 milhões de hectares de áreas protegidas que ajudam a conter o avanço do desmatamento e das queimadas na região.
“Ainda assim, o estado do Pará continua dando uma grande contribuição para a destruição da floresta na Amazônia. Os dados de 2019 foram alarmantes e, por conta disso, nasceu a necessidade de um projeto emergencial para realização de uma campanha contra o desmatamento desenfreado”, destaca Maria Aparecida. Ela relata que as regiões onde o desmatamento acontece em grande escala são principalmente as áreas não destinadas (que ainda não receberam titulação), mas também onde há conflitos agrários, quase sempre com ações ilegais ligadas ao garimpo e à extração de madeira.
“Os invasores estão até mesmo nas Terras Indígenas e Reservas Extrativistas. O descontrole é tão grande que optamos por um projeto especialmente voltado para a campanha contra o desmatamento e o mapeamento dos conflitos agrários”, afirma. Foram produzidos cartazes, folders e apostilas para oficinas de capacitação, baseados na legislação e em notas técnicas do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) e do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), com dados de queimadas e desmatamentos. O material foi distribuído em visitas até mesmo a localidades de difícil acesso dos municípios.
“Informar sobre o desmatamento e, em especial sobre os projetos de lei prejudiciais ao meio ambiente que estão em tramitação no legislativo, é um trabalho fundamental, porque muitas vezes, nas áreas rurais, há carência desse tipo de dado. Os agricultores não sabem como esses projetos de lei afetarão suas vidas”, acrescenta.
Foram utilizados também serviços de rádios comunitárias e rádio amador para expandir a campanha. “Capacitamos as comunidades também para que elas busquem informação e saibam a quem recorrer para lutar por seus direitos. Conhecer a lei e saber quem consultar é uma forma de reduzir a chance de que elas sejam enganadas por grileiros”, afirma Maria Aparecida.
Para estimular as comunidades a lutarem contra o desmatamento, é preciso ainda dar a elas condições de produzir de forma sustentável. Segundo Maria Aparecida, o projeto incluiu a divulgação de um guia prático, com técnicas e fundamentação legal. “Não queremos que eles parem de produzir. Há mecanismos que podem ser implementados para produzir a partir da recuperação de áreas degradadas, por exemplo. Mostramos que uma cultura como cacau pode permitir o reflorestamento de áreas tomadas por pastagens, com um retorno financeiro muito maior que a pecuária extensiva”, explica.
Outra frente do projeto é voltada aos problemas de ameaças às lideranças locais, especialmente em assentamentos. “Muitas vezes, essas lideranças se veem obrigadas a sair da sua localidade e não têm condições de pagar um advogado. Nosso grupo jurídico consegue apoiar algumas delas. Fizemos um levantamento de 23 casos em que nossos advogados conseguiram dar esse suporte”, conta.
Nas viagens realizadas pela equipe, os conflitos agrários foram mapeados e tipificados. A equipe percorreu grandes extensões. Só dentro município de Altamira os pesquisadores precisaram se deslocar por 2,2 mil quilômetros em uma picape 4×4 para visitar a Área de Proteção Ambiental Triunfo do Xingu, que fica em um distrito na divisa com Mato Grosso.
“Fomos em lugares que nunca tínhamos pensado em chegar e, nessas viagens, testemunhamos situações terríveis de injustiça e violência. Mapeamos 15 tipos diferentes de conflitos agrários em toda a região, alguns mais graves e violentos, mas todos com impactos no meio ambiente”, frisa Maria Aparecida. O mapa de conflitos agrários, já pronto, está sendo apresentado às comunidades de base e também às autoridades, incluindo prefeituras e agentes de segurança pública. “Fizemos ainda recomendações sobre o que precisa ser feito para reduzir os conflitos agrários”, declara ela.
A equipe da FVPP percebeu que os conflitos eram muito heterogêneos e contaram com a ajuda de pesquisadores da Universidade Federal do Pará para desenvolver uma tipologia capaz de identificar as diferentes situações. “Foram mapeados 15 tipos de conflitos, como grilagem, assentamentos de fazendeiros, de mineração em Terras Indígenas e de ribeirinhos expulsos pela construção de hidrelétricas”, diz Maria Aparecida.
Osvaldo Barassi Gajardo, especialista em conservação do WWF-Brasil, destaca que “trata-se de um projeto muito interessante para a organização por dar um suporte muito substancial às lideranças. O Fundo Emergencial foi criado para o apoio ao combate ao fogo e proteção territorial, mas também para apoiar lideranças que vêm sendo ameaçadas”.
O WWF-Brasil repassou à FVPP R$ 180 mil para o projeto. “Um dos aspectos mais importantes é que a Fundação está prestando apoio jurídico e técnico a grupos ameaçados. É um trabalho que tem o objetivo de monitorar o território, mapear as pressões e ameaças, mas olhar também para as pessoas, além de promover as campanhas de prevenção ao desmatamento e queimadas”, lembra Gajardo.
O mapa dos conflitos agrários dentro de projetos de assentamentos, de Unidades de Conservação e de Terras Indígenas terá, segundo o especialista em conservação, importância incalculável para orientar ações da sociedade civil e políticas públicas voltadas para combater o problema. “Muitas vezes, as ameaças partem de pecuaristas e de pessoas poderosas na região”, conclui.
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