Recuperação da Caatinga exige mais do que redução da pecuária, aponta estudo

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A simples redução da pecuária não é suficiente para recuperar os solos degradados da Caatinga, segundo pesquisa conduzida no semiárido de Pernambuco. O estudo, publicado no Journal of Environmental Management, revela que mesmo após três anos sem pastoreio, áreas antes superexploradas não apresentaram melhorias significativas na saúde do solo. A solução, defendem os especialistas, está na adoção de práticas complementares, como adubação verde e plantio de árvores estratégicas, capazes de acelerar a restauração ecológica.

A Caatinga, bioma exclusivamente brasileiro, enfrenta séria degradação devido ao desmatamento, pecuária intensiva e exploração de lenha. O sobrepastoreio, em particular, compacta o solo, reduz a infiltração de água e diminui drasticamente os níveis de carbono, nitrogênio e biomassa microbiana. Em áreas convertidas de floresta densa para pastagem, a perda chegou a 14,7 toneladas de carbono por hectare, agravando as mudanças climáticas.

O estudo comparou solos de três cenários distintos: florestas preservadas, áreas em regeneração e pastagens degradadas. Os resultados mostraram que, nas regiões onde o gado foi retirado, a recuperação natural foi lenta e insuficiente. Wanderlei Bieluczyk, pesquisador do Cena-USP e principal autor do estudo, explica que a saúde do solo depende de múltiplos fatores, incluindo estrutura física, ciclagem de nutrientes e biodiversidade microbiana. Sem intervenções ativas, a regeneração pode levar décadas.

Entre as técnicas recomendadas, a adubação verde se destaca por melhorar a fertilidade e a estrutura do solo. Essa prática, já bem-sucedida na Mata Atlântica, envolve o cultivo de leguminosas e gramíneas que fixam nitrogênio e protegem o solo contra erosão. Outra estratégia é o plantio de árvores de crescimento rápido, que criam microclimas favoráveis à regeneração natural.

Ana Dolores Santiago de Freitas, coordenadora da pesquisa, ressalta que a Caatinga possui características únicas, como clima semiárido e vegetação adaptada à escassez de água. Essas particularidades exigem abordagens específicas, considerando a diversidade de solos e a sazonalidade das chuvas.

A degradação na região tem raízes históricas, desde a remoção da vegetação nativa até a compactação do solo pelo pisoteio excessivo. Para reverter esse cenário, os pesquisadores defendem políticas públicas que incentivem o manejo sustentável e a recuperação de áreas degradadas. O estudo foi realizado em três municípios pernambucanos – Araripina, Sertânia e São Bento do Una –, onde amostras de solo e vegetação foram analisadas para avaliar os impactos da degradação e os efeitos iniciais da recuperação.

A pesquisa integra a Rede Perene do Observatório Nacional de Dinâmica da Água e do Carbono no Bioma Caatinga (CBC) e reforça a urgência de ações integradas para preservar um dos ecossistemas mais ameaçados do Brasil.

Stella Legnaioli

Jornalista, gestora ambiental, ecofeminista, vegana e livre de glúten. Aceito convites para morar em uma ecovila :)