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Para reduzir a dependência em relação a países terceiros, em 2020, a Comissão Europeia apresentou um plano de ação para as matérias-primas críticas que são essenciais para as chamadas “tecnologias do futuro”.

Por Elaine Santos, do Jornal da USP | Os últimos anos evidenciaram a capacidade do sistema energético de revelar o modo pelo qual o capital se reproduz em escala mundial, mas este não está submetido somente às determinações empresariais, mas às determinações do todo, inclusive da geopolítica. Prova disto é a forma como a pandemia de covid-19, a crise inflacionária e a guerra na Ucrânia, que são parte de uma crise sistêmica, reforçou a necessidade da diminuição da dependência em relação às matérias-primas energéticas, impondo uma reorganização das cadeias globais. Este argumento foi reforçado em um artigo publicado no Financial Times, onde os maiores gestores de ativos do mundo dão sinais de preocupação e de reorientação dos seus investimentos de modo a impedir interrupções nas cadeias de suprimentos. O artigo também alerta para os perigos da dependência europeia das importações de hidrocarbonetos, tema que venho acompanhando há algum tempo, especificamente a forma como a Europa está delineando sua “autonomia estratégica” energética e os reflexos deste projeto para os países exportadores de matérias-primas da América Latina.

Para reduzir a dependência em relação a países terceiros, em 2020, a Comissão Europeia apresentou um plano de ação para as matérias-primas críticas que são essenciais para as chamadas “tecnologias do futuro”. Um dos objetivos do plano é reforçar a aquisição de matérias-primas dentro da Europa, estabelecendo como ideal uma dependência que não supere os 33% em relação a nenhum país. Pressuposto que os obrigou a revisar sua estratégia industrial, detalhando áreas de risco e/ou conflito, através de um rastreamento da cadeia de suprimentos.

Com base no rastreio e na identificação das matérias-primas essenciais no plano econômico consolidado pela Aliança Europeia para as Matérias-Primas (ERMA, sigla em inglês), foram divulgados alguns estudos avaliando como a Europa poderia alcançar a segurança dos recursos. O estudo encomendado pela Eurometaux (associação que representa a indústria do metal na Europa), intitulado Metais para energia limpa, demonstra com dados específicos que sem metais e energia, nada será concretizado. Portanto, o aumento da mineração em território europeu passou a ser uma das condições para diminuir a dependência e cumprir as metas do Pacto Ecológico. Caso as previsões do estudo se confirmem, estima-se que até 2050, a indústria de metais precisará de um fornecimento muito maior de cobalto, zinco, níquel, alumínio, silício, cobre e elementos de terras raras. No caso do lítio, por exemplo, será necessária uma quantidade 35 vezes maior do que a utilizada atualmente. Entretanto, esta estimativa, que considera os grandes projetos europeus de mineração de lítio e metais raros, também revela limites, que vão desde as contestações por parte das populações locais, que não querem conviver com projetos de mineração em seus territórios, até dificuldades na obtenção dos licenciamentos, que podem desmotivar os investimentos em solo europeu e empurrar a exploração para outros países com legislações mais flexíveis. Situação que poderá levar a uma ampliação da extração de recursos no Sul global e, consequentemente, uma possível intensificação dos impactos socioambientais.

Tendo em conta o consumo energético desproporcional entre o Norte e o Sul, a vulnerabilidade institucional típica das democracias restringidas, quais são as implicações deste redimensionamento global para a América Latina?

Alguns artigos apontam que a baixa diversificação econômica de países com destaque na exportação de matérias-primas críticas, como a Argentina, Brasil, México, Colômbia e o Chile, somada às políticas minerais que desestimulam seus Sistemas Nacionais de Inovação (SNI), podem comprometer a adição de valor através da interação do conhecimento e capacidades em torno dos recursos minerais e indústria.

Este ponto corrobora com a divisão norte-sul, centro-periferia, pois, ao que tudo indica, no que tange aos seus recursos minerais, as políticas latino-americanas estão a ser pensadas para a exportação. Melhor dizendo, as nossas políticas de Estado não parecem propostas para fixar as matérias-primas críticas em suas economias e, a partir da inovação, buscar uma maior complexidade econômica, de modo a implantar na região mais etapas da cadeia produtiva. Ou seja, não temos a nossa autonomia estratégica!

Assim, se a transição energética é também uma corrida tecnológica, como o Brasil, condicionado à exportação de recursos, se insere nesta cadeia? A América Latina aprofundará o neoextrativismo dependente para que a transição energética ocorra no Norte global? Existe uma combinação possível entre minimizar os impactos do extrativismo e o desenvolvimento industrial latino-americano? São algumas perguntas iniciais que precisam ser pensadas e respondidas. Daí a importância de “pensar o Brasil” como se propôs a USP, indo além da leitura e reprodução de relatórios oficiais internacionais, bem como da transmutação de agendas do centro para as periferias que, geralmente, não analisam as condições político-econômicas e principalmente históricas de cada país.


Este texto foi originalmente publicado pelo Jornal da USP de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original. Este artigo não necessariamente representa a opinião do Portal eCycle.


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