“Sanguma” é o termo usado para nomear a bruxaria, e a sua crença, que existe predominantemente ao redor das Ilhas do Pacífico e, principalmente, em Papua-Nova Guiné. Assim como outras vertentes da bruxaria, o conceito de sanguma teve um início nas religiões e práticas populares e, inicialmente, era apenas uma forma de espiritualidade enraizada nas comunidades do Pacífico.
No entanto, ao longo dos anos, a palavra começou a carregar um outro significado nessas comunidades.
Em Papua-Nova Guiné, um país próximo à costa norte da Austrália, cerca de 80% da população habita aldeias remotas sem acesso a electricidade, água corrente ou cuidados de saúde. Esses fatores, combinados com a falta de acesso à informação do povo, contribuíram para a vilanização da sanguma — criando uma nova caça às bruxas.
Entenda as origens e os impactos da sanguma.
A palavra “sanguma” vem do interior perto do distrito de Bogia, na província de Madang. Ela deriva do termo ‘tsangumo’, que originalmente era usado para designar uma equipe de homens que passaram por treinamento especial para que fossem capazes de assassinar seus inimigos.
Porém, a possível atividade desse grupo de homens coincidiu com o início da disseminação da língua Tok Pisin, hoje usada pela maioria das pessoas de Papua Nova-Guiné. Assim, acredita-se que a palavra tenha se espalhado através de uma desinformação e erros de tradução.
Além do início do desenvolvimento da língua oficial do país, a colonização Alemã também tomava Papua-Nova Guiné. Ambos esses fatores contribuíram para a desinformação da palavra tsangumo — enquanto muitos ainda associavam-na ao grupo de homens, o medo tomou conta da população, cuja resposta à violência foi culpá-la na bruxaria.
“Ainda hoje, quando você pergunta às pessoas da região de Bogia o que significa sanguma, é isso que você ouvirá. Para eles, sanguma é /tsangumo/, que é o que homens treinados fazem, fisicamente e com o apoio de forças espirituais, aos corpos e mentes das suas vítimas”, explica o portal Stop Sorcery Violence.
Enquanto a verdadeira “bruxaria” da Ilha dos Pacíficos era apenas a extensão de crenças e práticas populares, a sanguma tomou outra proporção. Devido à origem confusa da palavra, ela ainda possui diversas interpretações ao longo das aldeias de Papua-Nova Guiné.
Segundo o Stop Sorcery Violence, existem pelo menos seis significados distintos da palavra no país.
Assim como na antiga caça às bruxas que ocorreu entre os séculos 14 e 18 na Europa e na América do Norte, muitas mulheres de Papua-Nova Guiné são condenadas por crimes de bruxaria. Sem a intervenção do sistema de justiça, as acusações resultam em episódios de violência bruta, instigados pela própria população e que, em muitos casos, levam à morte de pessoas inocentes.
Segundo uma matéria da ABC, a polícia local raramente prende os autores de tal violência. Os agentes que trabalham na região alegam que não possuem a mão-de-obra necessária e que as comunidades simplesmente se recusam a cooperar com a polícia.
As vítimas são quase exclusivamente mulheres vulneráveis — mães solteiras, viúvas, doentes ou doentes mentais. A ONU estimou que há 200 assassinatos de “bruxas” anualmente no país. Porém, ativistas locais estimam que até 50 mil pessoas foram expulsas de suas casas devido a acusações de sanguma.
Em 2013, duas mulheres acusadas de sanguma foram mortas, crime que obteve uma grande repercussão internacional. A partir disso, o governo respondeu revogando a Lei da Feitiçaria de 1971 — que permitia que assassinos usassem a alegação de bruxaria como legítima defesa.
No entanto, acredita-se que a intervenção legal é apenas o primeiro passo na luta contra os crimes de violência baseados em alegações de bruxaria de Papua-Nova Guiné. E que, além disso, são necessárias intervenções holísticas para a conscientização do povo sobre o assunto.
Por exemplo, o projeto Touching the Untouchables (TTC), que pode ser traduzido para “Tocando os Intocáveis”, tem o objetivo de disseminar informações médicas para comunidades sem serviços de saúde.
“As crenças de feitiçaria e sanguma estão profundamente enraizadas em nossas crenças culturais. Então, todo mundo, qualquer membro da família que morre ou alguém na comunidade que morre de uma doença ou enfermidade, todos ainda culpam ou dizem que é um ataque de sanguma ou feitiçaria por causa de crenças culturais, e apenas alguns sabem que é por causa da doença”, diz Esther Silas, uma das fundadoras do TTC.
Portanto, para que essas crenças sejam desmistificadas, Silas e outros colaboradores do TTC criam workshops que abordam todas as doenças evitáveis e até mesmo as instalações de higiene e saneamento na comunidade.
“Através das sessões, a comunidade percebeu que pode prevenir a maioria das doenças criando coisas simples como lavatórios de mãos, embelezando o local e construindo esgotos na comunidade. Então, quando eles percebem que podem fazer isso sozinhos, isso os motiva a agir”, conta Silas à Scientific American.
Confira o vídeo, em inglês, sobre o assunto publicado pela Scientific American:
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