Savanização da Amazônia pode colapsar bioma de forma irreversível e está preocupando cientistas e ambientalistas
O processo de savanização da Amazônia foi observado pela primeira vez pelo pesquisador brasileiro Carlos Nobre, que notou que a floresta amazônica estava sendo substituída por uma vegetação semelhante à do Cerrado brasileiro. Alguns anos mais tarde, uma pesquisa realizada pela cientista Lílian Sales revelou que a savanização pode ter impactos profundos na ocorrência de fauna.
Em sua pesquisa, a bióloga chamou atenção para o fato de que as espécies de vertebrados das regiões de transição entre florestas e savanas serão, cada vez mais, substituídas por espécies de savana aberta, em um processo que ela denominou como “savanização faunística“.
Em um modelo de projeção matemática, Lílian mostrou que haverá um aumento em 11% e 30% das espécies de savana nas florestas de mata atlântica, enquanto a ocorrência daquelas espécies que dependem de florestas densas cairá pela metade. Esse processo já é observado e tem gerado preocupação na comunidade ambientalista e científica. Um pesquisa registrou 22 ocorrências inesperadas do lobo-guará — animal típico de savana — na Amazônia nos últimos 25 anos.
Bioma amazônico
O bioma amazônico era limite para a ocorrência do lobo-guará, mas a ocupação humana nas bordas do Cerrado tem causado sérias modificações na paisagem natural, substituindo a vegetação de floresta úmida nativa por pasto e monocultura de grãos.
Isso tornou o local propício para a propagação de espécies típicas da savana, como a lobeira, ou fruto-do-lobo (Solanum lycocarpum), uma espécie de tomate selvagem fundamental para a dieta do lobo-guará, um dos motivos para sua ocorrência em territórios atípicos.
O fenômeno foi descoberto pelo pesquisador brasileiro Carlos Nobre, na década de 90. Mais tarde, a bióloga Lilian Sales, também brasileira, descobriu que a savanização é responsável por significativa alteração na ocorrência de espécies de fauna. Savanização é o processo irreversível de transformação de áreas ocupadas por densa vegetação em desertos parciais, e tem como principal agente a ação humana, especialmente na Amazônia.
A pesquisadora define a savanização como o processo de conversão de várias florestas tropicais em savanas derivadas.
Como ocorre a savanização
A savanização ocorre por meio do processo de degradação da vegetação, como é o caso de plantio de monoculturas, desmatamento e queimadas. Em um estudo, o pesquisador Bernardo Monteiro Flores mostrou que há duas principais causas da savanização da Amazônia: a expansão da fronteira agrícola ao redor do bioma — que ele chama de “arco do desmatamento” —, e um processo de savanização que parte do centro da Amazônia, bem longe da fronteira agrícola e gerado principalmente por conta de incêndios.
Mas a savanização também é influenciada pelas mudanças climáticas, aumento da temperatura, mudanças no regime de chuvas e alteração da paisagem, como ravinamentos (formação de sulcos no solo) no domínio dos mares de morros decorrentes da atividade cafeeira desenvolvida no século passado no Brasil.
As árvores de savana representam 11% da cobertura vegetal da Amazônia, conhecidas pela população local de “campinas”, elas são semeadas por meio da ação da água, peixes e aves. Esse tipo de cobertura vegetal é mais resiliente do que as florestas inundáveis, chamadas de florestas de igapó ou de igarapé. Segundo os pesquisadores, em entrevista para a Agência Fapesp, se o clima amazônico se tornar mais seco e os incêndios mais intensos e frequentes, as florestas inundáveis desaparecerão.
Como mitigar a savanização
A pesquisadora Lílian Sales defende que, para mitigar a savanização da Amazônia é preciso tomar uma série de ações que, em boa medida, dependem de esforços políticos. Entre elas, estão o reflorestamento, a criação de corredores ecológicos, recomposição de matas ciliares e o cumprimento da legislação ambiental.