Solidão da mulher negra: entenda o conceito

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A solidão da mulher negra é um conceito que faz referência à forma como pessoas negras do gênero feminino são isoladas pela sociedade. Apesar do senso comum relacionar a solidão dessas pessoas apenas ao âmbito romântico, a mulher negra também sofre sozinha com o peso das opressões quando se trata de amizades, relações trabalhistas e funções parentais.

O que é e como surgiu o feminismo negro?

De acordo com a socióloga Heleieth Saffioti: “O patriarcado pode ser conceituado como uma estrutura de poder baseada em uma ideologia machista que hierarquiza os homens e mulheres, tendo primazia masculina e, por conta da desigualdade de poder existente entre os sexos, deixa as mulheres em posição inferior aos homens em todas as esferas da convivência humana”.

Sendo assim, a desigualdade de gênero é um tipo de discriminação que tem como objetivo manter a soberania masculina na sociedade. Ao mesmo tempo que exclui e marginaliza ações femininas. No caso da mulher negra, além de ser uma das vítimas do machismo, ela também é constantemente inferiorizada pelo racismo na sociedade. 

Quando se compara os resultados deste tipo de discriminação, a mulher negra é tratada como inferior a homens brancos por ser preta e do gênero femino; inferiorizada em relação a mulheres brancas por ser negra; e, por fim, não écolocada no mesmo patamar que homens negros, por ser mulher.

 Quais as raízes da solidão da mulher negra?

Se você é brasileiro, certamente já deve ter ouvido a frase “branca para casar, mulata para transar, e preta para trabalhar”. A expressão racista tem suas raízes na escravização, e exemplifica como funcionavam as relações com mulheres durante o período. Isso porque, mulheres brancas eram as senhoras e sinhas de grandes famílias, enquanto mulheres negras e pardas eram responsáveis pelo trabalho forçado e eram vítimas de abusos sexuais dos senhores. 

Conforme o Brasil avançava em direção da abolição da escravatura, surgia entre a elite branca o objetivo de embranquecer a população. Isso porque alguns dos estudiosos mais influentes da época defendiam que a escravização havia impedido a “pureza racial brasileira”, e para alcançar isso era preciso reduzir consideravelmente a população negra.

Mas como a branquitude pretendia fazer isso? Além da proibição da entrada de imigrantes negros no País, que aconteceu até meados do século XX, era incentivada a miscigenação com o intuito de clarear a população. Ou seja, os abusos cometidos por senhores de escravizados eram tidos como uma forma de embranquecer a população negra.

Esse embranquecimento não remete apenas à cor da pele de um indivíduo. Ainda hoje, pessoas negras que assumem estereótipos impostos pela branquitude são mais “aceitas e vistas”. Sendo assim, homens negros que tinham relacionamentos com mulheres brancas eram reconhecidos como parte da sociedade — mesmo que de forma prejorativa. 

Mulheres negras e a solidão: um panorama

Uma pesquisa, publicada na revista ABPN, analisou os dados de 62 mulheres negras de até 58 anos de idade. No final do estudo, 47% dessas mulheres afirmaram se sentir solitárias sempre ou às vezes (34% sempre e 13% às vezes). Segundo as voluntárias, levando em consideração suas experiências amorosas, homens negros preferem se relacionar com mulheres brancas. 

Conforme explicam as pesquisadoras envolvidas na análise, “existe uma percepção, por essas mulheres, de que os homens negros preferem mulheres brancas, por serem escolhas vantajosas no sentido de obter maior status social, por exemplo, e também por conta dos efeitos do racismo, o que levaria à percepção de que as mulheres negras seriam a última opção para um relacionamento”. 

Além disso, o estudo menciona os estereótipos racistas relacionados à sexualidade da mulher negra — que é constantemente sexualizada — contribuem para o isolamento dessa população. Sendo assim, para os homens, essas pessoas servem apenas para o “aprendizado da sexualidade” e encontros casuais, e nunca como esposas ou companheiras.

A guerra contra o racismo estrutural na ciência

Mais dados

No Brasil, 11,05 milhões de famílias têm uma chefia feminina, em casas onde elas são solteiras e têm filhos. Sendo que, 62% dessas mulheres são negras, e os outros 38% são pessoas não negras. Os dados são do relatório do Dieese, baseado na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios. A pesquisa também revelou que esses casos são 15% mais comuns que casas com chefia masculina. 

Segundo estudos da Universidade Federal da Bahia (UFBA), lares comandados por mulheres negras são mais propensos a passar fome. Os dados apontam que 21,2% deles têm insegurança alimentar moderada ou grave. Enquanto os outros 25,6% possuem insegurança alimentar leve.

Esses fatores refletem na saúde dessas pessoas. Isso porque de acordo com o Boletim Çarê-IEPS n. 1/2022 Saúde Materna da Mulher Negra, mulheres negras são as que mais morrem durante o parto e pós parto. Essa estatística se mostra mais agravante quando se descobre que essas são as mesmas mulheres que têm o menor acesso a tratamentos pré-natal durante a gestação.  

Ana Nóbrega

Jornalista ambiental, praticante de liberdade alimentar e defensora da parentalidade positiva. Jovem paraense se aventurando na floresta de cimento de São Paulo.

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