A morte de Nery Guarani Kaiowá, ocorrida na Terra Indígena Nhanderu Marangatu, em Antônio João (MS), nesta quarta-feira (18), é mais um episódio trágico da violência crescente contra comunidades indígenas no Brasil. A Polícia Militar foi acusada de envolvimento direto no ataque que culminou com o assassinato, levantando questionamentos sobre a atuação das forças de segurança em territórios indígenas e sua relação com pecuaristas da região.
Os confrontos começaram ainda durante a madrugada e se intensificaram ao longo da manhã. A ação policial resultou na morte de Nery, deixou uma mulher ferida e levou à destruição as moradias da retomada indígena na Fazenda Barra, território sobreposto à Terra Indígena (TI) Nhanderu Marangatu. Mesmo sem a presença da Força Nacional na área, a situação se agravou com a retirada do corpo de Nery pela Polícia Militar, que o arrastou para uma área de mata, aumentando a revolta entre os indígenas que tentavam recuperar o corpo, de acordo com as lideranças indígenas do local.
Os ataques ocorrem em um contexto de disputas territoriais e denúncias de genocídio contra os Guarani Kaiowá, frequentemente alvos de operações policiais que, segundo as lideranças indígenas, têm respaldo de decisões judiciais. Desde 12 de setembro, a Polícia Militar do Mato Grosso do Sul intensificou sua presença na TI Nhanderu Marangatu, cercando a comunidade, bloqueando o acesso a recursos hídricos e promovendo prisões ilegais, segundo relatos dos moradores. Esse cenário de tensão já havia sido denunciado à Missão de Direitos Humanos que visitou a região na semana passada, pouco antes dos ataques que vitimaram Nery.
A violência praticada contra os Guarani Kaiowá não é um caso isolado. Em 2022, o Massacre de Guapoy, em Amambai, também envolveu a Polícia Militar e levou à exumação do corpo de Vitor Fernandes Guarani Kaiowá para nova perícia. O histórico de mortes e agressões levou a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) a acionar o Supremo Tribunal Federal (STF), que reconheceu a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 1059, visando enfrentar a violência policial no estado. Até o momento, no entanto, a Suprema Corte não emitiu uma decisão que pudesse impedir novos casos, como o assassinato de Nery.
O envolvimento de fazendeiros locais, como a família de Luana Ruiz, advogada ruralista e assessora da Casa Civil do governo estadual, também gera questionamentos. A família Ruiz, proprietária da Fazenda Barra, onde ocorreu o ataque, teria obtido decisões favoráveis da Justiça Federal, que autorizaram a Polícia Militar a atuar como segurança privada na área em disputa. Esse conluio entre interesses políticos e rurais tem sido apontado como um dos motores da violência sistemática contra os indígenas da região.
A Apib e o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) pressionam por ações concretas do STF para reverter o quadro de violência. Uma das propostas é que a Polícia Militar seja impedida de atuar em terras indígenas, o que poderia ter evitado a morte de Nery Guarani Kaiowá. No entanto, a falta de uma resposta firme até o momento perpetua a insegurança das comunidades indígenas, que seguem lutando por seus direitos e pela preservação de seus territórios, mesmo diante de ameaças constantes e ataques mortais.
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