A teoria da higiene, também conhecida como hipótese da higiene ou teoria higiênica, surgiu nas décadas de 70 e 80 do século XX, quando o número de casos de pessoas com doenças alérgicas começou a crescer, levando a uma série de investigações científicas. Uma das hipóteses foi a ocorrência de algum tipo de alteração de cunho ambiental, pois o aumento de ocorrências se deu muito rápido, o que descartou a possibilidade de mudança genética.
Primeiramente formulada em 1989 pelo epidemiologista Dr. Strachan, a teoriada higiene relaciona o aumento da susceptibilidade de doenças alérgicas a pessoas que não foram expostas durante a infância a agentes patogênicos, como os micro-organismos ou parasitas, deixando-as, então, predispostas a desenvolverem propensão a alergias – isto é, o sistema imune dos indivíduos não foi devidamente estimulado nos primeiros anos de vida.
Sally F. Bloomfield explica a teoria em outras palavras: “o sistema imunológico é um dispositivo de aprendizagem e, no nascimento, se assemelha a um computador com hardware e software, mas poucos dados. Dados adicionais devem ser fornecidos durante os primeiros anos de vida, por meio do contato com micro-organismos de outros humanos e do ambiente natural.”
Segundo a teoria da higiene, a convivência com micro-organismos pouco agressivos, presentes naturalmente no ambiente no passado, auxiliava na modulação das respostas imune do corpo humano, já que esse contato nas primeiras fases de desenvolvimentos evitam respostas imunológicas exageradas a substâncias estranhas ao longo da vida.
A resposta imune do organismo humano contra ameaças infecciosas (vírus, bactérias e helmintos) é gerenciada pelos linfócitos (células de defesa) TH1 e TH2. Quando ocorrem infecções por micro-organismos no início da vida, essas respostas são geradas por esses linfócitos. Portanto, eles são essenciais para manter o equilíbrio das respostas pró-alérgicas de células TH2, já que isso costuma ocorrer por meio do amadurecimento de células TH1. Então, a exposição a micro-organismos patógenos na infância estimula o sistema imune e protege o indivíduo contra o desenvolvimento de alergias.
Explicando melhor, a diminuição do contato de crianças com patógenos diversos causa um desequilíbrio entre o TH1 e o TH2, pois essa atitude impede a manifestação de doenças agudas, inibindo a ação dos linfócitos TH1, e assim, favorecendo a ativação dos linfócitos TH2. Uma resposta imune desregulada pode ser responsável pela manifestação de atopias (predisposição para desenvolver asma, rinite alérgica e dermatite atópica).
A exploração do conceito da teoria da higiene gerou vários estudos. Acredita-se que crescimento do número de casos de doenças alérgicas se deva ao aumento da higiene (pessoal ou pública) e consequente decrescimento do número de doenças infecciosas nos países industrializados. Muitos países viram uma epidemia de doenças, em parte, porque houve aumento da urbanização, reduzindo o ambiente natural.
Vários outros fatores podem ter contribuído para a alteração da exposição microbiológica, como diminuição do número de pessoas por família, antibióticos, menor tempo de amamentação, sanitização, disponibilidade de água e comida limpa e a mudança da vida rural para a vida urbana.
Dividir a cama quando se é criança, fato mais provável de ocorrer em grandes famílias, acarreta maior exposição a micro-organismos e, de acordo com estudos, produz um efeito protetor contra atopias.
Frequentar creches também é uma atitude que ajudaria a validar a hipótese, já que a convivência na creche gera maior probabilidade de a criança adquirir resfriados comuns. Como reportado pelo estudo respiratório infantil de Tucson, crianças que frequentaram a creche nos seis primeiros meses de vida ou tinham um ou mais irmãos mostraram baixo nível de desenvolvimento de asma.
Sem contar que o uso de antibióticos faz uma “limpeza” no intestino, já que seu uso nos primeiros anos de desenvolvimento pode influenciar a colonização bacteriana do intestino, eliminando também bactérias que ajudam o organismo. Um estudo com ratos de laboratório, proposto por Bjőrkstén, mostrou que as alterações induzidas por antibióticos no trato gastrointestinal podem afetar o modo como o sistema imunológico responde aos alérgenos comuns nos pulmões. Entretanto, seu uso não se mostrou associado com o aparecimento de atopias, mas sim com o surgimento de eczema.
A amamentação também proporciona um efeito protetor contra infecções, mediado pela transferência de anticorpos maternos e por componentes que afetam o intestino da criança, mostrando-se um fator importante para a validação da teoria. Em um estudo feito no Canadá com crianças de um a dois anos, foi observado que, em crianças amamentadas apenas até os nove meses, ocorreu um maior risco de surgimento de asma do que em crianças amamentadas por mais tempo.
Mudanças na higiene pública, como melhorias na sanitização e na qualidade da água e da comida foram projetadas para diminuir o contato humano com agentes patógenos, porém alteraram também nosso contato com bactérias benignas, como as micobactérias ambientais.
A vida rural contribui também para a diminuição de atopias, tendo uma maior contribuição se esse modo de vida envolver convivência com os animais e/ou agricultura. Na pesquisa sorológica e em questionário de 16 anos, de Gassner-Bachman e Wuthrichm, é mostrado que filhos de fazendeiros possuem menos doenças atópicas e níveis menores de soroprevalência para uma ampla gama de alérgenos, enquanto crianças com contato esporádico com a natureza obtiveram níveis intermediários.
Muitos estudos apoiam essa teoria por meio de pesquisas que mostram nexo causal entre o aumento acentuado de doenças alérgicas nos últimos desde as décadas de 70 e 80 e a redução do nível de exposição aos micróbios. Entretanto, há estudos contraditórios em relação à hipótese, tornando as evidências inconclusivas.
Interpretações populares como “sujeira é boa para nós” são perigosas e contribuem para a perda de confiança do público quanto à higiene doméstica. Assim, os cientistas têm deixado de adotar o termo “teoria da higiene” já que ele pode ser mal interpretado. É importante deixar evidente conceitos como a diferença entre “sujeiras” e “germes” e “limpeza” e “higiene”, para assim compreender melhor o tipo de exposição positiva e negativa na qual se está sujeito.
Sem conhecer a natureza da exposição microbiana que pode ser crítica para o amortecimento imune, é difícil reformular a política de higiene a favor da melhoria da função imune, sem comprometer a proteção contra doenças infecciosas. A segmentação seletiva da exposição microbiana é um processo muito complexo, podendo ter, por exemplo, na água não tratada até 109 micobactérias por litro, dificultando preservar as espécies “amigáveis” ao remover aquelas que podem causar doenças.
Uma opção que já está sendo pesquisada é uma vacina atenuada, contendo tipos de micróbios “certos” (como micobactérias saprófitas), já que, com aplicações de vacinas, não há conflitos com a higiene. Já há evidências de eficácia desse tipo de vacina em estudos com animais e em alguns ensaios com humanos.
Para diminuir o risco de alergia em crianças é provável que o indivíduo faça uma terapia, onde este seja exposto a altas doses ou crônicas do alérgeno, ajudando na indução da tolerância da maturação do centro germinativo. Se o paciente se expuser a baixas, esporádicas e intermitentes quantidades do alérgeno, isso aumentará sua reação alérgica, devido à falta de memória B. Já em adultos que o sistema imunológico está “destreinado” e já sensibilizado pelas substâncias estranhas, a solução será evitar o contato com os alérgenos e tratar seus sintomas.
Embora a hipótese não seja conclusiva, esta presta um forte apoio a iniciativas que busquem melhorar a prática de higiene. Seja qual for a realidade sobre atopia e exposição microbiana, uma “higiene direcionada” deve ser aplicada. A higiene direcionada é baseada na intervenção seletiva de quando e onde os riscos de infecção são maiores, procurando proteger quando há maximização dos efeitos nocivos, porém se expondo a micróbios de efeitos benéficos em nosso ambiente humano e natural.
Muito foi dito sobre como a higiene excessiva pode prejudicar seu organismo e que é necessário se atentar para a prática da higiene direcionada. Mas como fazer isso sem comprometer a proteção contra agentes prejudiciais à saúde? Uma das formas é buscar produtos alternativos (como os encontrados em nossa loja)!
O Brasil é considerado um dos países de maior consumo de produtos de higiene pessoal, e grande parte deles é composta por produtos antibacterianos. Eles são procurados como justificativa para eliminar maus odores e evitar manchas nas roupas, diminuindo o suor. Entretanto, o que não se percebe é que, com o uso de um desodorante bactericida, haverá maior resistência das bactérias nas axilas, intensificando o odor antes naturalmente exalado, fazendo com que o usuário precise usar sempre aquele produto e em maior frequência/quantidade, de modo a até piorar o problema inicial.
Em nossa higiene pessoal há muitos produtos bactericidas que eliminam bactérias benéficas ao nosso corpo e tornam outras mais resistentes, não só prejudicando nossa saúde, mas também nos tornando refém desses produtos. Poucas pessoas sabem dos riscos que correm ao utilizar esses produtos e das alternativas ambientalmente corretas que temos disponíveis (como o uso de desodorantes orgânicos e veganos, e o uso bicarbonato de sódio para remover as manchas).
Grande parte dos sabonetes (em barra, líquidos, bactericidas), pastas de dente, desodorantes, antissépticos e perfumes no mercado contém uma substância chamada triclosan. Essa substância é considerada um éter difenil policlorado (PBDE), capaz de inibir o desenvolvimento de fungos, vírus e bactérias benéficas em baixas concentrações e matar esses organismos em altas concentrações. Essa substância é relacionada também à resistência de agentes patogênicos, seu o uso trará resistência aos antibióticos, prejudicando sua saúde.
Além dos malefícios à saúde humana, alguns estudos apontam que essa substância também é prejudicial ao meio ambiente. Em ambientes aquáticos, há a desregulamentação do sistema endócrino, por meio de alterações dos níveis de hormônio da tireoide, além de bioacumular no organismo dessas espécies (o que pode causar intoxicação humana por meio do consumo).
Evite o uso de produtos bactericidas e que contenham outras substâncias nocivas à saúde encontradas em grande parte dos cosméticos e kits de higiene, buscando equilibrar a higiene direcionada com o uso de produtos mais ecológicos para sua higiene e para a limpeza de sua casa, de forma que não prejudique a saúde nem o meio ambiente.
Também é importante manter maior exposição social por meio de esportes e atividades ao ar livre e gastar menos tempo em ambientes fechados. Durante a pandemia de COVID-19, por exemplo, especialistas levantaram preocupação, pois muitas crianças passaram muito tempo em confinamento, sem contato social e limitadas a algumas atividades.
A hipótese é que isso se reflita em um grupo de “jovens pandêmicos” que sofrerão com taxas acima da média de alergias, asma e doenças auto-imunes.
Assista a um vídeo com o médico alergista e imunologista, Wilson Rocha Filho, explicando a teoria da higiene e seus indícios.
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