Testes genéticos revelam que práticas indígenas criaram a castanha-do-pará

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A atividade humana ao longo dos séculos deixou marcas profundas na composição genética das castanheiras-do-pará, uma das espécies mais emblemáticas da Amazônia. Pesquisadores dos Institutos Max Planck de Geoantropologia e Biologia de Tübingen, na Alemanha, utilizaram análises genômicas para desvendar como práticas históricas e contemporâneas influenciaram a diversidade genética dessa árvore, essencial para a biodiversidade e a economia local. O estudo, publicado na revista Current Biology, destaca a importância de integrar conhecimentos tradicionais indígenas em estratégias de conservação.

A pesquisa analisou 270 amostras de castanheiras-do-pará (Bertholletia excelsa) em diferentes regiões da Bacia Amazônica, identificando mais de 126 mil variantes genéticas. Os resultados mostram que a diversidade genética da espécie sofreu um declínio acentuado nos últimos 20 mil anos, agravado por eventos como a colonização europeia, o desmatamento e a extinção da megafauna, que incluía dispersores naturais de sementes, como as preguiças-gigantes. No entanto, áreas com histórico de manejo indígena apresentam uma complexidade genética maior, sugerindo que práticas tradicionais de uso da terra contribuíram para a preservação da variabilidade genética.

Um exemplo notável foi observado na Floresta Nacional de Tefé, onde castanheiras mais jovens, com menos de 200 anos, exibem origens genéticas mais diversificadas em comparação com outras regiões. Esse padrão está ligado ao manejo sustentável praticado por comunidades locais, que promovem a regeneração natural e a dispersão de sementes. Segundo Victor Caetano-Andrade, pesquisador do Instituto Max Planck de Geoantropologia, essas práticas indígenas são fundamentais para a resiliência da espécie diante de mudanças ambientais.

O estudo também aponta que a perda de diversidade genética pode comprometer a adaptabilidade das castanheiras-do-pará a futuras alterações climáticas. A espécie, que já enfrenta pressões como a exploração madeireira e a fragmentação de habitats, depende de estratégias de conservação que considerem tanto fatores ecológicos quanto antropogênicos. A colaboração entre cientistas e comunidades indígenas é vista como um caminho promissor para desenvolver políticas de conservação mais eficazes e inclusivas.

Além de fornecer insights sobre a história demográfica das castanheiras-do-pará, a pesquisa abre caminho para estudos futuros que ampliem o escopo para outras espécies e regiões da Amazônia. A integração de dados genômicos com conhecimentos tradicionais pode ajudar a construir modelos de manejo sustentável que beneficiem tanto a biodiversidade quanto as populações locais.

A Amazônia, lar de uma das maiores biodiversidades do planeta, continua a revelar como a interação humana moldou seus ecossistemas ao longo do tempo. Este estudo reforça a necessidade de políticas que reconheçam o valor das práticas indígenas e promovam a conservação de espécies-chave, como a castanheira-do-pará, para garantir a resiliência da floresta diante dos desafios ambientais do século XXI.

Stella Legnaioli

Jornalista, gestora ambiental, ecofeminista, vegana e livre de glúten. Aceito convites para morar em uma ecovila :)

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