Transição energética europeia é irreversível e moldará parcerias internacionais, diz nova análise

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As energias renováveis serão a principal fonte de eletricidade da União Europeia até 2030, prevê o think tank pan-europeu Strategic Perspectives. Um novo relatório da organização divulgado nesta terça (16) na Europa diz que a implementação do Acordo Verde Europeu levará a um declínio de 31% e 34% para gás e petróleo, respectivamente, até o fim desta década na comparação com os níveis de 2019.

O documento enfatiza que parcerias com países externos ao bloco estão se tornando um pilar fundamental da implementação do Acordo Verde para governos nacionais e empresas. Com a queda da demanda, os combustíveis fósseis deixam de ser um investimento compensador neste sentido, mas novas cooperações internacionais em tecnologias e matérias-primas para a transição energética ganham ainda mais relevância na UE.

A análise se debruçou sobre dois elementos centrais do Acordo Verde Europeu: o pacote Fit to 55, que estabelece metas para que a União Europeia corte 55% de suas emissões anuais de gases de efeito estufa até 2030; e o esforço emergencial de guerra RePowerEU, que cria um roteiro para redução da dependência do gás russo para bem antes do fim da década.

Segundo o relatório, o carvão não será mais competitivo em termos de custo e será eliminado gradualmente. Por outro lado, se todas as leis forem implementadas corretamente e dentro do prazo, elas levarão a uma duplicação da capacidade de energia renovável em comparação com 2021.

Os dados da pesquisa acompanham as tendências atuais. Já neste ano, a redução da demanda de gás e a geração renovável recorde ajudaram a UE a enfrentar um inverno turbulento, afastando os temores de um retorno do carvão como consequência da guerra. Em 2022, as energias eólica e solar geraram um recorde de eletricidade da UE (22%), ultrapassando pela primeira vez o gás fóssil (20%) e permanecendo acima da energia do carvão (16%).

“Os países que buscam exportar gás, carvão e petróleo para a UE não devem se iludir: o consumo está diminuindo, de forma irreversível”, crava Linda Kalcher, Diretora Executiva da Strategic Perspectives. “Novas parcerias econômicas em tecnologias verdes são a melhor opção para ambos os lados. A Europa não está voltando atrás em suas promessas e muitas empresas já estão se beneficiando.”

“Como um continente com recursos limitados de gás e petróleo, a União Europeia está tomando a opção estratégica correta: usar a transição líquida zero como um instrumento de segurança energética contra ameaças geopolíticas. O Acordo Verde Europeu reduzirá o equivalente ao consumo anual de gás da Alemanha em apenas sete anos. O novo mundo é alimentado por tecnologias limpas”, disse Neil Makaroff, diretor da Strategic Perspectives.

Os números deste relatório tiveram grande repercussão no mundo político e na sociedade civil europeia. Uma das diplomatas mais importantes para a criação do Acordo de Paris, Laurence Tubiana, CEO da European Climate Foundation, comemorou o prognóstico. 

“A UE sabe da necessidade de se afastar de uma dependência tóxica de combustíveis fósseis e tem a estrutura para fazer isso acontecer”, disse Tubiana. “É necessário, está acontecendo e é inevitável. Nem sempre foi uma linha reta, mas a mensagem é clara: o futuro está longe do gás, do carvão e do petróleo.”

“A transição verde da Europa finalmente acabará com nossa dependência do petróleo, gás e carvão russos e garantirá nosso acesso a energia confiável e barata”, comemora Marcin Korolec, ex-ministro do Meio Ambiente da Polônia e presidente da Fundação de Promoção de Veículos Elétricos (FPPE). 

“As principais empresas têm sido defensoras de longa data da capacidade do Acordo Verde de definir o caminho para a neutralidade climática, reduzir a dependência da UE em relação aos combustíveis fósseis e garantir a competitividade da indústria no futuro. As conclusões deste relatório reforçam essa confiança”, avalia Ursula Woodburn, Diretora do Corporate Leaders Group Europe (CLG Europe). 

“Elas mostram o poder crescente do setor de energias renováveis e que as bombas de calor e os carros elétricos estão a caminho de substituir os aparelhos e veículos de origem fóssil em apenas alguns anos”, completa Woodburn. 

Apoio a empresas e famílias 

O fim da forte dependência de combustíveis fósseis importados resultará em economias significativas para as empresas e as famílias europeias, de acordo com o relatório. 

O custo da geração de eletricidade a partir de fontes renováveis diminuirá com o tempo, ao contrário do custo da geração de eletricidade a partir de combustíveis fósseis, que continuará aumentando. A transição energética pode reduzir os preços médios da eletricidade para empresas e residências em mais de 7% até 2030.

Além disso, segundo a Strategic Perspectives, a aceleração da descarbonização da economia europeia por meio do Acordo Verde contribuirá para a criação de 475.000 empregos líquidos até 2030.

“Agora é hora de os agentes públicos e privados arregaçarem as mangas para implementar políticas no local. Eles devem trabalhar juntos para desbloquear o financiamento e acelerar o desenvolvimento de uma base industrial líquida zero e do setor de energia limpa para o benefício do clima, da economia e dos cidadãos”, afirma Woodburn. 

Na mesma linha, Tubiana disse que os Estados-Membros da UE têm a responsabilidade de implementar esse projeto de forma justa. “Em nome da segurança e da solidariedade, eles devem essa visão aos cidadãos europeus e ao mundo”, disse a diplomata francesa.

“Com mais da metade da nossa eletricidade proveniente de energia solar e eólica até 2030, e a rápida implantação de bombas de calor e veículos elétricos, a UE nos oferece todas as soluções de que precisamos para construir nossas economias, garantir empregos e reduzir nossas contas de energia”, finaliza Korolec. 

Reações ao relatório

Mohamed Adow, Diretor da Power Shift Africa, disse:

“Apesar dos últimos suspiros do setor de combustíveis fósseis, a era da energia suja está chegando ao fim. Esse legado destruiu o clima e causou um sofrimento incalculável por meio de eventos climáticos extremos e temperaturas altíssimas. Felizmente, a era das energias limpas, baratas e renováveis é inevitável. Mas a questão é se os líderes europeus agirão com rapidez suficiente para impedir os danos devastadores que estão sendo causados na África e em outros lugares. O Acordo Verde é um passo importante na direção certa, mas precisamos vê-lo promulgado rapidamente se quisermos que a Europa seja vista como uma aliada dos países vulneráveis ao clima, como o meu, ou apenas mais um lugar para falar.”

Kimiko Hirata, Diretora Executiva do Climate Integrate, disse:

“A Europa vem nos enviando sinais há anos – os dados são claros: a transição líquida zero é real, está acontecendo e está funcionando. Ela beneficia as famílias, os empregos e as empresas. Não podemos ser deixados para trás e perder não apenas a competitividade, mas também o acesso ao maior mercado único do mundo. Chegou a hora de a Europa, a Ásia e o mundo investirem na ampla gama de opções limpas comprovadas e escalonáveis e pararem de adiar a eliminação gradual dos combustíveis fósseis e a eletrificação de diversos setores.”

Frances Colón, Diretora Sênior de Política Climática Internacional, Center for American Progress, disse:

Queda da demanda de gás, carvão e petróleo e aumento da produção e eletrificação de renováveis – a Europa está inequivocamente em um caminho de afastamento dos combustíveis fósseis, e isso está valendo a pena. A implementação de seu Acordo Verde protegeu a UE durante os últimos anos difíceis. Além disso, eles estão ampliando e tornando mais verdes seus planos econômicos e industriais. Os números comprovam que o compromisso de nossos parceiros europeus com a transição para o zero líquido reduzirá constantemente os preços da energia para empresas cada vez mais competitivas e consumidores mais capacitados. Podemos esquecer a intensificação das vendas de petróleo, gás e carvão para a UE. O futuro está nas tecnologias de energia limpa, e é nisso que nossas parcerias devem se concentrar.”

Julian Popov, ex-ministro do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos da Bulgária, disse:

“A UE deu início a uma transição que já está claramente em andamento – e é imparável. Até 2030, um grande número de europeus aquecerá suas casas com bombas de calor e usará carros elétricos. Mais da metade dessa energia virá da energia solar e eólica. Isso tornará milhões de europeus imunes à extorsão de energia fóssil da Rússia.  A transição energética criará milhares de empregos nos países da Europa Central e Oriental. Precisaremos de milhões de instaladores de painéis solares, técnicos de bombas de calor e especialistas em veículos elétricos. A eletricidade barata tornará nossos setores mais competitivos. O Acordo Verde Europeu trará prosperidade para todos e é a melhor estratégia econômica para o século XXI.”

Brick Medak, diretor de políticas europeias e internacionais da Stiftung KlimaWirtschaft (Aliança de CEOs alemães para clima e economia), disse:

“A transição energética e o Acordo Verde Europeu podem e serão benéficos para todos na Europa. Teremos melhores condições. Isso criará muitos empregos, fornecerá eletricidade mais barata, protegerá contra a inflação e tornará a indústria da UE e outras empresas mais competitivas em seu caminho para a neutralidade climática.”

Carolina Hisatomi

Graduanda em Gestão Ambiental pela Universidade de São Paulo e protetora de abelhas nas horas vagas.

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