Tristeza prazerosa: por que gostamos da tristeza?

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O conceito de “tristeza prazerosa” é um paradoxo curioso das emoções humanas. Ele sugere que pensamentos e sentimentos negativos, nesse caso a tristeza, podem causar a um espectador alheio a felicidade ou prazer — geralmente resultante da exposição a alguma forma de arte. 

As emoções desempenham um papel importante na arte, tanto atualmente quanto ao longo da história e nas culturas humanas. Na música, por exemplo, temas melancólicos como o amor e a perda são recorrentes e procurados por ouvintes. Essas emoções são responsáveis não apenas por desencadear sentimentos nos ouvintes, mas também nos conectam através de experiências compartilhadas. 

E, embora a tristeza explorada nas artes seja talvez a principal emoção que os criadores querem transmitir, outras pessoas reportam o contrário — a felicidade. 

De fato, estudos já mostraram que muitas pessoas não associam músicas tristes a emoções negativas. Pelo contrário, descobriram que a música triste evoca uma agradável sensação de nostalgia e tranquilidade nos ouvintes. Causando, assim, o fenômeno conhecido como “paradoxo da tristeza prazerosa”. 

A biologia por trás da tristeza prazerosa

Já foi comprovado que a música pode afetar fisicamente o ser humano, causando reações típicas da emoção da tristeza. Alguns desses efeitos incluem diminuição na energia e mudanças nas medidas da atividade do sistema nervoso autônomo, como:

  • Pressão arterial;
  • Frequência cardíaca;
  • Variabilidade da frequência cardíaca;
  • Condutância da pele. 

No cérebro, estudos de ressonâncias magnéticas mostram que a tristeza desencadeia um aumento na atividade de partes da rede límbica, incluindo o cingulado anterior e o córtex insular, bem como no hipocampo, giro parahipocampal, amígdala e caudado. (1)

A música triste ativa essas mesmas regiões cerebrais, o que sugere que ouvintes realmente sentem-se tristes ao ouvir essas melodias. Porém, não explica exatamente como essa tristeza pode se tornar prazerosa e promover o bem-estar em vez de desencadear pensamentos negativos comuns relacionados às emoções negativas. 

Empatia ou efeito indireto?

Ao longo do tempo, a comunidade científica levantou inúmeras hipóteses para entender a psicologia por trás da tristeza prazerosa. A empatia, por exemplo, foi altamente explorada por sua influência nos sentimentos humanos. 

Na biologia, quando experienciamos perda ou empatizamos com os sentimentos alheios, liberamos hormônios como a prolactina e a ocitocina. Este último, também é conhecido como “hormônio do amor”. 

Não é comprovado que o cérebro produz esses hormônios quando ouvimos músicas tristes. Porém, algumas teorias endossam que isso poderia explicar porque podemos experimentar sensações prazerosas após sermos expostos à tristeza. 

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Além disso, outros especialistas apontam que, na verdade, a “tristeza prazerosa” que sentimos não é verdadeira, e sim um resultado de “ser movido” pelas artes. 

“Estudos anteriores referem-se a uma ‘hipótese do efeito indireto’, o que significa que as pessoas podem sentir tristeza, mas é outra coisa de que gostam – ficar comovidas (…) Porque se emocionar é um sentimento misto de aspectos positivos e negativos”, explica o Professor Emery Schubert do Laboratório de Musicologia Empírica da Escola de Artes e Mídia, UNSW Arts, Design & Architecture.

Academia da tristeza 

Segundo Aristóteles, a tragédia evoca “terror e piedade”, permitindo que os espectadores alcancem a “catarse” emocional ou purgação de emoções negativas. 

Semelhantemente, outras teorias credenciam músicas tristes como “academias” em que os seres humanos podem exercitar emoções simuladas.

Ou seja, as artes evocam sentimentos tristes sem o “comprometimento” da tristeza real. Assim, possibilitando que os espectadores consigam aprender com essas emoções. 

Tristeza verdadeira 

Uma pesquisa de 2024 levantou uma hipótese que confirma a existência da tristeza prazerosa em seres humanos. Segundo as descobertas publicadas no jornal PLOS ONE, as emoções negativas sentidas ao ouvir música podem realmente produzir prazer.

“É paradoxal pensar que você poderia desfrutar de algo que o faz sentir uma emoção negativa. Mas esta pesquisa mostra a primeira evidência empírica de que a tristeza pode afetar positivamente o prazer da música, diretamente”, explica Prof. Schubert, líder do estudo. 

Para o estudo, 50 participantes – principalmente estudantes de graduação em música – selecionaram uma peça musical que evocava tristeza que eles adoravam, que incluía clássicos de Ludwig van Beethoven até Taylor Swift. Porém, eles não foram explicitamente instruídos a escolher músicas onde gostassem da tristeza.

Os participantes, então, foram instruídos a imaginar se a sua tristeza poderia ser “removida” ao ouvir a música – o que a maioria relatou que poderia fazer. Após o experimento, foi relatado que 82% dos participantes sentiram menos prazer nas músicas. 

“As descobertas sugerem que a tristeza sentida ao ouvir música pode realmente ser apreciada e pode aumentar o prazer de ouvi-la”, disse Schubert.

Para o grupo de controle, os pesquisadores também testaram a hipótese do efeito indireto. No entanto, os participantes relataram sentir tristeza além de se emocionarem e se sentirem “movidos”, o que indica a distinção entre os dois sentimentos que antes eram comparados. 

“Anteriormente, pensava-se que quando as pessoas sentiam tristeza em resposta à música que gostavam, elas estavam realmente se emocionando”, diz o professor Schubert. “Mas as descobertas deste estudo sugerem que ficar emocionado e sentir tristeza têm significados sobrepostos.

“Em outras palavras, ficar emocionado provoca tristeza, e a tristeza desencadeia ser emocionado.”

Assim, foi confirmado que a tristeza prazerosa faz parte do catálogo das complexas emoções humanas. E que, embora paradoxal, esses sentimentos podem se complementar. 

Júlia Assef

Jornalista formada pela PUC-SP, vegetariana e fã do Elton John. Curiosa do mundo da moda e do meio ambiente.

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