Por Sandra Sedini em IEA USP — A 26ª Conferência de Estados-Parte da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas – COP 26 realizada em Glasgow, Escócia, em 2021, pautou-se pela constatação de que os compromissos assumidos pelas Nações signatárias do Acordo de Paris em suas respectivas NDCs (Contribuições Nacionalmente Determinadas) não serão suficientes para manter o aumento da da temperatura global em patamares seguros, abaixo dos 2 °C.
A contribuição do Terceiro Grupo de Trabalho para o 6º Relatório de Avaliação do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas – IPCC, dedicada à Mitigação das Mudanças Climáticas, confirmou que as estimativas das emissões globais feitas pelas NDCs apresentadas até a COP 26 não só levarão o aquecimento global a ultrapassar o 1,5°C como também tornarão mais difícil limitá-lo a 2°C após 2030.
O cenário demanda que os países signatários da UNFCCC redirecionem os compromissos assumidos em suas NDCs no sentido da rápida descarbonização de suas economias, desenvolvendo estratégias e implementando ações que permitam zerar as suas emissões líquidas de carbono até 2050.
Para o setor energético, especificamente, o 6º Relatório do IPCC alerta que é preciso aumentar a produção de fontes de energia de baixa emissão e o uso de eletricidade e de portadores alternativos de energia e reduzir significativamente o consumo de combustíveis fósseis.
Mais ainda, o 6º Relatório estima, com alto grau de confiança, que a continuidade dos investimentos em carvão e outras infra estruturas fósseis poderá bloquear o sistema energético em patamares altos de emissão de gases com efeito estufa, tornando mais difícil limitar o aquecimento global a 2°C ou 1,5°C.
No que tange à transição energética, o Brasil ocupa uma posição relativamente privilegiada, embora tenha muito o que avançar para zerar suas emissões líquidas de carbono no setor de energia. De acordo com o 4º Inventário Nacional de Emissões, com dados de 2016, o setor de energia produz 21,6% das emissões brasileiras de GEE, correspondente a 423.580 Gg CO2e, gerados em sua maior parte pelo subsetor de transportes.
Segundo o Relatório do Balanço Energético Nacional – BEN para o ano de 2021, 40,4% da produção de energia primária e 48,4% da oferta interna de energia advém de fontes renováveis. Adicionalmente, 84,8% da eletricidade provém de fontes renováveis, com destaque para a fonte hídrica, que responde por 65,2% da oferta no país.
Entretanto, no campo da produção de energia elétrica, o aumento dos períodos de seca, em associação às mudanças globais do clima, tem comprometido a capacidade produtiva do setor hidráulico brasileiro. Esse panorama, associado ao incremento sustentado do consumo de eletricidade no país, tem demandado o acionamento das usinas termelétricas levando, por consequência, ao incremento no consumo de combustíveis fósseis como o gás natural e o carvão mineral. Assim, o desafio que se coloca para o Brasil no setor energético é o de ampliar o uso das fontes renováveis em substituição aos combustíveis fósseis.
O estado de Santa Catarina ocupa uma posição peculiar em comparação ao contexto nacional. Segundo o BEN 2021, 31,57% da energia produzida em Santa Catarina é gerada por termelétricas e 25,41% da eletricidade catarinense tem como fonte energética o carvão mineral. Em 2020, a região carbonífera, localizada ao sul do estado de Santa Catarina, produziu 2.712 10³t de carvão mineral, do tipo carvão vapor, o que corresponde a cerca de 50% da produção nacional de carvão. Estima-se que o setor carbonífero seja responsável atualmente pela geração de ao menos 3.600 empregos diretos.
Mais de um século de exploração do carvão na região sul do estado de Santa Catarina produziu um significativo passivo ambiental, objeto de ações civis públicas, movidas pelo Ministério Público Federal, pleiteando a recuperação das áreas degradadas, indenização dos moradores e correção dos problemas de segurança da estrutura das minas.
A mobilização da sociedade civil em favor da total desativação da atividade carbonífera em Santa Catarina, por meio de organizações como o Fórum dos Atingidos pelo Carvão Mineral, contrapõe-se aos interesses dos atores econômicos envolvidos na cadeia produtiva do carvão mineral, como as mineradoras e as usinas termelétricas, que defendem a continuidade da sua exploração.
O Governo Federal tem se posicionado a favor da continuidade da exploração do carvão mineral, apostando no desenvolvimento de tecnologias para exploração e transformação sustentável do recurso. Na COP 26, juntamente com China, Índia e Estados Unidos, o Brasil recusou-se a assinar o documento firmado por 77 países pelo compromisso para zerar a produção de energia à base de carvão. A Lei Federal nº 14.299, editada em 5 de janeiro de 2022, prorrogou subsídios ao carvão mineral para geração de energia elétrica até 2040 e instituiu um Programa de Transição Energética Justa – TEJ para preparar a região carbonífera do Estado de Santa Catarina para o provável encerramento da atividade de geração termelétrica a carvão mineral nacional sem abatimento da emissão de gás carbônico (CO2) no mesmo marco temporal. Cercada de grande polêmica, a medida já é objeto de uma Ação Declaratória de Inconstitucionalidade, distribuída ao Supremo Tribunal Federal em março deste ano pelo PSOL, PSB e Rede Sustentabilidade.
Os municípios da região carbonífera de Santa Catarina concentram as emissões de GEE do estado. Para zerar as emissões líquidas de carbono-zero até 2050, Santa Catarina precisa encontrar alternativas para o setor carvoeiro, considerando não só a produção de energia elétrica, mas também os impactos sociais, econômicos e ambientais envolvidos no processo de descarbonização.
Nesse contexto, o Centro de Síntese USP Cidades Globais promove, em colaboração com o CEURS – Centro de Estudos Urbanos e Regionais para a Sustentabilidade da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC, este Seminário UrbanSus – Sustentabilidade Urbana, no intuito de discutir estratégias, propostas e soluções voltadas a acelerar a transição energética do setor carbonífero de Santa Catarina de maneira sustentável e orientada às metas climáticas para 2050.
Alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU, o ciclo de seminários UrbanSus – Sustentabilidade Urbana visa refletir sobre o papel das cidades e estimular as boas práticas ao compartilhar soluções sustentáveis urbanas – tecnologias sociais, ambientais e urbanas inovadoras, congregando academia, sociedade e setor público.
Comissão Organizadora: Debora Sotto, Claudia Kniess, Jamile Sabatini Marques e Tatiana Tucunduva P. Cortese (pesquisadoras do Centro de Síntese USP Cidades Globais)
Acompanhe a transmissão do evento em www.iea.usp.br/aovivo
Evento público e gratuito | Sem inscrição
Evento on-line | Não haverá certificação
Centro de Síntese USP Cidades Globais
Associação Brasileira das Empresas de Software (ABES)
Centro de Estudos Urbanos e Regionais para a Sustentabilidade (CEURS)
Programa de Pós-Graduação em Cidades Inteligentes e Sustentáveis (UNINOVE/PPGCIS)
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)
9h | AberturaArlindo Philippi Jr. (IEA e FSP/USP) e Leonardo Porto Ferreira (SEMA/SC) |
9h15 | Exposição:Cenário global e a posição do BrasilArlindo Philippi Jr. (IEA e FSP/USP)Contexto e desafios do Estado de Santa CatarinaAna Letícia Aquino (SEMA/SC)Transição energética, governança multinível e planejamento energéticoHumberto Gracher Riella (UFSC)Posicionamento da sociedade civilNicole Figueiredo de Oliveira (Instituto Internacional Arayara)Programa de Capacitação em Municipalização da Agenda 2030 e Potencialidades para Transição de Matriz Energética RegionalRoberto Pacheco (PPGEGC/UFSC e CEURS)Moderação:Debora Sotto (IEA USP)Relatoria:Nathan Debortoli (Consultor independente) e Jairo Almeida (UNINOVE/PPGCIS) |
11h | Debates |
11h45 | Encerramento |
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Este artigo não necessariamente representa a opinião do Portal eCycle.
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