Do plantio das uvas ao armazenamento: conheça tudo sobre o processo de produção do vinho

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O vinho está presente na cultura humana desde a pré-história. A bebida alcoólica é produzida a partir da fermentação do sumo (ou suco) de uvas. Leveduras consomem os açúcares presentes na uva, transformando-os em álcool. Trata-se de uma bebida tão comum que dificilmente as pessoas param para pensar sobre como funciona a cadeia produtiva do vinho.

A imagem do pequeno produtor pisando em uvas é hoje uma realidade rara. Atualmente, grande parte dos vinhos é produzida em escala industrial. É preciso se perguntar sobre as consequências desse modo produtivo no vinho, mas, para isso, precisamos entender como se faz vinho.

Uma parte muito importante da produção de vinhos é o cultivo da videira (também conhecia como parreira ou vinha). A matéria-prima do vinho é a uva, por isso, sua qualidade irá interferir, e muito, no produto final. Diversos fatores podem influenciar na primeira parte da produção de um vinho: a qualidade do solo, as condições climáticas, os métodos para cultivo, a colheita, a manipulação e uma infinidade de outros fatores.

Cada casta de uva é ideal para a produção de um tipo de vinho, e outros são feitos com a combinação de uvas. A maioria dos vinhos é produzida a partir da espécie Vitis vinifera, de origem europeia, que possui inúmeras castas, como a Cabernet Sauvignon, a Merlot, a Chardonnay, entre tantas outras.

Uvas são muito sensíveis. Para lidar com pragas e as mudanças climáticas, a maioria dos produtores encontra nos agrotóxicos e fertilizantes a saída (saiba mais sobre os impactos na saúde e no meio ambiente causados pelos agrotóxicos aqui, e pelos fertilizantes aqui). A utilização de espécies geneticamente modificadas tem sido estudada também, mas ainda não possui grande aceitação.

A cultura da videira se restringe a latitudes, por um lado compatíveis com o crescimento e desenvolvimento harmonioso da Vitis vinifera e, por outro lado, coincidentes com o clima mediterrâneo (e respectivas variantes). Cada variedade de uva possui suas especificidades e apresenta um ciclo diferenciado, principalmente quanto à sua duração. Há variedades que apresentam um ciclo mais longo (especialmente em regiões mais frias), e variedades de ciclo mais curto (especialmente em regiões mais quentes).

As condições ambientais impactam a videira em todos seus estágios fenológicos: do repouso vegetativo, passando por brotação, floração, frutificação, crescimento das bagas e chegando à maturação até a queda das folhas. Cada estágio necessita da quantidade correta de luz, água e calor para o desenvolvimento adequado. Por isso, produtores utilizam irrigações controladas, tratamentos químicos, indução artificial de dormência nas videiras, quebra desse período com produtos químicos, etc.

A videira depende da temperatura ambiente para suportar a atividade enzimática que está na base de seu ciclo vegetativo. As baixas temperaturas do inverno provocam o repouso vegetativo nas videiras – quanto mais frio fizer, melhor será a dormência e as condições para a brotação. Na hibernação, a planta perde as folhas e entra e latência. Nesse período, é feito o plantio, a enxertia das plantas novas, a adubação e a poda seca das plantas velhas.

Nos últimos dias do inverno ou no inicio da primavera, ocorre o “choro”. Nessa época, a planta começa a perder seiva através dos cortes da poda. Dessa forma, as hastes e ramos começam a recuperar a água e os minerais perdidos no inverno.

Após o “choro”, ocorrem os períodos de crescimento: brotação, crescimento, floração, vingamento, pintor e maturação. Na fase de brotação, a videira desperta após o inverno. Quanto melhor a distribuição de ramos e frutos, melhor foi a brotação, beneficiando posteriormente a fase de maturação. Depois, as primeiras folhas começam a surgir e a videira ganha força para começar a dar sinais de floração. Pequenos cachos com minúsculas flores surgem e se apresentam para a fertilização. A fertilização varia de vinha para vinha – há variedades que realizam esse processo antes da floração, ou que precisam de outras variedades presentes para dar prosseguimento ao processo.

Após a fertilização e o surgimento dos frutos, há a maturação ou processo conhecido entre os produtores de vinho como o “pintor”. Nele, os frutos começam a mudar de cor, há o aparecimento da cor tinta nas películas dos bagos tintos e da película translúcida nas castas brancas. No processo de maturação, a uva ganha força, volume e acumula açúcares livres (glucose e frutose), potássio, aminoácidos, compostos fenólicos e vai perdendo ácido tartárico e ácido málico (eles representam 90% dos ácidos presentes na uva) até atingirem o estágio ideal para a colheita. Devido ao acumulo de açúcares e a perda de acidez, o pintor é uma fase determinante no paladar que o vinho terá futuramente.

A colheita no período adequado para a casta da uva é fundamental para produzir vinhos ricos e equilibrados. Se a uva é colhida cedo, resulta uma bebida com pouco álcool; a colheita tardia, por sua vez, resulta um vinho com muito álcool, mas com baixa acidez.

A colheita pode ser realizada manualmente ou mecanicamente. Na colheita manual, os cachos são retirados com tesouras especiais e armazenados em caixas de vime ou plástico. Dessa forma, as caixas podem ser empilhadas sem danificar a uva. Na colheita mecânica, um trator passa por cima das videiras, chacoalhando-as para que as uvas caiam num reservatório embutido.

Produção

A cadeia produtiva de um vinho depende muito do produtor, do tipo de vinho que se almeja, da casta de uva utilizada, entre outras variáveis. A fabricação do vinho é uma alquimia que demanda cuidado em cada etapa. Em linhas gerais, a fabricação do vinho inclui os processos de: esmagamento das uvas, fermentação da pasta, decantação, nova fermentação do líquido, filtragem e engarramento. Contudo, quanto mais industrial a produção for, mais aditivos serão adicionados ao processo.

Quando as uvas chegam na vinícola após a colheita, as caixas são pesadas e o grau glucométrico é determinado, para calcular o potencial alcoólico e eventuais correções. Durante os processos de sulfitagem, fermentação, maceração, filtragem, envelhecimento etc, diversos aditivos químicos como antioxidantes, ativantes, nutrientes, clarificantes, desacidificantes, enzimas, estabilizantes, taninos, entre outros, são empregados para manipular sabores e aromas.

Após colhidas e selecionadas, as uvas passam pelo processo de prensagem, realizado normalmente com rolos cilíndricos metálicos perfurados. Nesse processo, há o rompimento da casca dos frutos, criando uma pasta de suco, casca e sementes, chamada de mosto. A prensagem deve ser sutil para evitar que partes sólidas da uva sejam trituradas.

Em seguida, o mosto passa por uma desengaçadeira, onde serão retirados os engaços (pedúnculos e ramificações do cacho de uvas). Essa separação é importante para impedir um aumento indesejável do nível de tanino e limitar a adstringência, o amargor e o gosto herbáceo. Após a separação, o mosto é destinado aos tanques de fermentação, que podem ser feitos de aço inoxidável, de madeira ou de cimento.

A principal diferença na produção de vinhos tintos e de vinhos brancos, é que os vinhos brancos demandam do processo de separação do mosto das partes sólidas da uva, imediatamente após o esmagamento. As cascas cedem as antocianinas, substâncias que dão cor à casca, e passam a coloração ao vinho, além de tanino. Por esse motivo, o vinho branco pode ser feito de uvas brancas ou, mais raramente, de uvas vermelhas, desde que sempre sejam separadas as cascas no início do processo.

Já nos vinhos tintos, as cascas de uvas vermelhas (roxas ou azuladas) são mantidas por algum tempo para conferir coloração, aroma e sabor ao líquido. Esse processo é chamado de maceração, onde ocorre a extração de compostos contidos nas cascas da uva.

Há também o processo chamado de maceração carbônica, completamente diferente da maceração tradicional. Ele consiste na colocação de cachos inteiros em uma atmosfera saturada com gás carbônico durante cerca de dez dias. Esse processo auxilia no “amolecimento” da parede celular das cascas e polpas, facilitando a extração de diversos compostos. Os vinhos franceses da região do Beaujolais são elaborados com o emprego dessa técnica.

O vinho é fruto da transformação do açúcar da uva em álcool e sem produtos secundários. Para a obtenção de cada um grau Gay-Lussac (1°GL) de álcool, são necessários 17 g/l de açúcar na uva. Em locais onde as condições naturais de cultivo da videira não permitem que a uva madura acumule níveis de teores adequados de açúcar, é realizada a correção de açúcar ou chaptalização. A legislação brasileira estabelece que a chaptalização não pode ultrapassar a correção máxima de 3°GL potenciais.

A sulfitagem é um dos processos tradicionais na produção de vinho e consiste no acréscimo de dióxido de enxofre (ou anidrido sulfuroso – SO2), para impedir a oxidação do vinho. O composto é bactericida, sendo utilizado para controlar o crescimento de leveduras e bactérias no mosto. Ao longo do processo de vinificação, novas sulfitagens são feitas. Elas corrigem os teores de SO2, que diminuem por evaporação e por reações químicas.

O processo de fermentação é o que faz o mosto ou suco da uva tornar-se alcoólico. As leveduras transformam os açúcares da uva dissolvidos no mosto (glicose e frutose) em álcool etílico, gás carbônico e subprodutos (glicerol, acetaldeído, ácido acético, ácido láctico, etc). Sem leveduras, não existe fermentação; e sem fermentação, não há vinho.

Atualmente, a maioria dos vinhedos faz uso de leveduras selecionadas. Existem diversos preparados comerciais, compostos por leveduras secas ativas. A escolha entre as diversas cepas da leveduras comerciais dependerá do tipo de vinho que se deseja produzir: vinhos brancos, tintos, espumantes, entre outros.

Após esses processos, o vinho é separado da parte sólida. Essa operação se chama descuba. Se a descuba for efetuada após poucos dias de maceração, a fermentação alcoólica continuará de modo lento após esse processo. Porém, se a maceração for longa, a fermentação já estará completa após a descuba.

O bagaço que é separado do vinho no processo de descuba passa por uma prensa e origina um vinho de qualidade inferior, apelidado de “vinho de prensa”, ou destilado.

Quase todos os vinhos tintos, e alguns brancos, passam por uma segunda fermentação: a fermentação malolática. Esse processo consiste na transformação do ácido málico presente no vinho em ácido láctico, com libertação de CO2 gasoso, pela adição de bactérias lácticas. O ácido málico torna os vinhos tintos microbiologicamente instáveis, pois bactérias lácticas continuam atuando no vinho mesmo após o engarrafamento. Se este ácido não for eliminado do vinho antes do envase, o vinho tinto pode criar gás dentro da garrafa. A fermentação malolática ocorre habitualmente após a fermentação alcoólica, mas é acelerada com a adição de bactérias lácticas. Com a transformação do ácido málico (mais forte) em ácido láctico (mais fraco) o vinho diminui seu grau de acidez e fica mais equilibrado.

Diversos componentes derivados uva (polifenóis e ácido tartárico) ou da autólise das leveduras (proteínas e peptídeos) são neutralizados ou induzidos à sedimentação por métodos químicos ou físicos e então extraídos. Bactérias, leveduras, resíduos sólidos e matéria orgânica se depositam no fundo do tanque. Para retirar esses resíduos, o vinho passa por processos como: trafegas, atestos, filtrações e estabilização. Dessa forma, é garantida a limpidez e a estabilização desejada. Partículas em suspensão, moléculas de proteínas e complexos metálicos deixam o vinho turvo e opaco.

A trasfega é a ação de passar o vinho de um recipiente para o outro, eliminando o depósito precipitado. O atesto é o preenchimento periódico dos tanques, à medida em que o nível do vinho diminui (por conta de evaporação ou da mudança de temperatura) evitando o contato do vinho como o ar. A estabilização tartárica do vinho ocorre em baixas temperaturas, quando cristais se decantam. Por isso, no inverno ela ocorre naturalmente. Para acelerar o processo, resfria-se o vinho até -3°C a -4°C, durante oito a dez dias. Esse método provoca a insolubilização e a precipitação dos sais, principalmente o bitartarato de potássio. As partículas são filtradas e eliminadas, deixando o vinho tinto límpido e brilhante. A clarificação industrial, utiliza a celulose, a sílica (diatomito, rocha constituída de restos silicosos fósseis da alga unicelular diatomácea), e o PVP (polivinil) e a caseína (phosphoproteina isolada do leite).

A filtração deve ser efetuada com muita precisão. Ela serve para retirar micropartículas indesejáveis, mas não deve diminuir muito sua estrutura e intensidade aromática. Parte dos atributos do vinho se perde junto com as substâncias indesejadas. Por esse motivo, diversos vinhos de qualidade dispensam esse processo. Alguns vinhos passam por um processo de envelhecimento em barris de carvalho. Chamados “vinhos de guarda”, os vinhos ricos em tanino passam por um processo de amadurecimento, devido à oxigenação lenta e gradativa que o carvalho oferece. Esse processo favorece a clarificação e a estabilização do vinho. Após o final da estabilização, vinhos varietais, os produzidos com uma única variedade de uva, ou alta predominância de uma uva, são engarrafados. Já os vinhos de corte, também chamados blend ou assemblage, são misturados com vinhos de outras uvas, para somar qualidades, e multiplicar a complexidade de sabores e aromas.

Engarrafamento

Existem alguns materiais usados para vedar as garrafas: rolhas de cortiça maciça, rolha de aglomerado de cortiça, rolhas sintéticas e tampa de rosca. A cortiça utilizada para a fabricação de rolhas é extraída da casca do sobreiro, carvalho da espécie Quercus suber. A rolha feita de cortiça maciça é de melhor qualidade, mas existe a rolha de aglomerado, que é mais barata. A rolha de aglomerado é feita de cortiça moída e cola. A cola pode passar aromar negativos ao vinho, por esse motivo alguns produtores optam por adicionar um disco de cortiça maciça na parte da rolha que fica em contato direto com o líquido.

Contudo, quando a cortiça é atacada por um fungo, ela pode liberar uma substância química volátil chamada tricloroanisol (TCA), que causa odores desagradáveis de mofo no vinho.

A rolha sintética oferece algumas vantagens: é mais barata, permite que o vinho seja guardado em pé e não transmite o TCA. Já a tampa de rosca, conhecida como screwcap, possui fácil manuseio e tem sido amplamente utilizada em vinhos de consumo jovem.

Sua longevidade, contudo, não está comprovada para uso em produtos de guarda.

No preenchimento das garrafas, uma máquina injeta gás nitrogênio, substituindo o ar da garrafa. Esse procedimento é importante para evitar a ocorrência de oxidação na garrafa e para preparar o vinho para a fase de envelhecimento.

Muitos ainda consideram as rolhas de cortiça natural como a melhor forma vedação para tampar garrafas de vinho. Antes de sua utilização, são conservadas em embalagens fechadas, com dióxido de enxofre. Para uma boa vedação, o diâmetro das rolhas é maior que o diâmetro da boca da garrafa. Por esse motivo, elas necessitam ser comprimidas para a introdução na garrafa.

Armazenamento

Após o engarrafamento o processo de vinificação chega ao seu final. A maturação do vinho se inicia dentro da garrafa de maneira gradual. Na garrafa, o vinho deixa de estar em um ambiente oxidante e passa a estar em um ambiente redutor, onde irá desenvolver aroma terciário, ou de envelhecimento. O tempo de envelhecimento do vinho depende do potencial de cada vinho, podendo variar de alguns meses a muitos anos.

O local escolhido para armazenar o vinho deve ser escuro, protegido da luz solar direta e até da iluminação artificial; mantido em temperatura de, em média, 12°C constantes; com nível de umidade entre os 65% e os 75% para evitar o ressecamento da rolha, e devem ser guardados horizontalmente.

O vinho pode ser muito benéfico para a saúde, se consumido com moderação, de uma fonte confiável, de preferência orgânico e com o mínimo de aditivos químicos possível. A Loja eCycle possui em seu catálogo opções de rótulos orgânicos.

Equipe eCycle

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