No último mês de setembro, foi publicada uma pesquisa realizada pela Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, que gerou polêmica no debate em torno dos alimentos orgânicos e da agricultura sustentável. A conclusão do estudo foi a de que os alimentos orgânicos não apresentam valor nutricional superior ao dos convencionais.
Para chegar a tal conclusão, foi realizada uma análise de 17 estudos comparativos entre pessoas que ingeriam alimentos orgânicos e pessoas que não o faziam. Serviram também como fonte de dados 223 pesquisas realizadas sobre a quantidade de nutrientes, microorganismos e defensivos agrícolas em diversos tipos de alimentos de origem animal e vegetal.
Apesar dos níveis nutricionais não apresentarem diferenças significativas, foi observado que os alimentos orgânicos contêm, em média, 30% menos agrotóxicos do que os produzidos convencionalmente, reforçando os resultados empíricos do esforço dos produtores de orgânicos por empregar técnicas menos agressivas ao meio ambiente e que utilizem menos agrotóxicos.
A conclusão gerou controvérsias e críticas por muitos especialistas no tema que sustentam a tese de que alimentos orgânicos possuem valor nutricional mais elevado. Apontou-se que os estudos comparativos em humanos tiveram duração de dois anos ou menos, impedindo a observação dos efeitos de longo prazo. Também surgiram diversas críticas pontuais em relação aos métodos empregados, que não levariam em conta a influência de fatores como o solo e o clima nos resultados das medições. Houve ainda o apontamento de outro estudo similar que chegou a uma conclusão oposta, ou seja, de que os orgânicos são de fato mais nutritivos.
O jornalista e especialista no assunto Michael Pollan, não se contentou com os resultados obtidos na nova pesquisa, alegando que são necessários estudos mais detalhados sobre o tema. Autor de O Dilema do Onívoro e Em defesa da Comida, livros que abordam a questão. Em entrevista ao repórter Jon Brookes, Michael defende ainda que o que é mais relevante e positivo no cultivo orgânico é justamente a redução do impacto ambiental e a multiplicação de técnicas mais sustentáveis. Isso, por si só, já justificaria o investimento em uma produção agrícola mais ecológica.
Chuck Benbrook, professor de agronomia da Universidade de Washinton e membro do The Organic Center , publicou uma resposta ao estudo de Stanford no site da universidade em que leciona, em que alega, dentre outras coisas, que suas conclusões da análise da mesma bibliografia são bem diferentes. Para o autor, alguns dos principais benefícios da agricultura orgânica observados são:
Portanto, na perspectiva de Chuck, são inegáveis e latentes os benefícios para a saúde advindos de uma dieta orgânica.
No website ConsumerReports.org foi publicado um artigo apontando as supostas limitações do estudo realizado. Segundo o artigo, muitos dos estudos utilizados na análise apontam benefícios nutricionais relativos à ingestão de alimentos orgânicos, como os níveis mais altos de fósforo e fenóis (um tipo de antioxidante), ou a maior concentração de ômega 3 no leite e no frango orgânicos. Outros estudos utilizados não foram capazes de identificar benefícios claros, levando a resultados gerais heterogêneos, o que seria muito diferente de concluir que não há benefício nutricional algum.
O mesmo artigo aponta também que apenas três dos 17 estudos realizados com cobaias humanas abordam resultados para a saúde. Dois deles seriam focados em alergias em crianças, o que seria uma estranha medida para comparar dietas orgânicas com convencionais, já que não existiria razão para uma possível correlação entre uma dieta orgânica e a menor incidência de reações alérgicas.
Assim com outros especialistas, a publicação alerta para o fato de que os efeitos nocivos dos pesticidas são observados em longo prazo, e que, portanto, o prazo de dois anos de observação das cobaias não seria suficiente para analisar tal questão.
A professora de nutrição e políticas de alimentação Marion Nestle, critica a abordagem midiática do tema. Alega que a literatura publicada sugere fortemente que alimentos orgânicos possuem maior valor nutricional e que seu consumo reduz a exposição aos pesticidas e às bactérias resistentes aos antibióticos. De acordo com Marion, a análise conclui que alimentos orgânicos possuem níveis muito menores destes agentes prejudiciais, o que seria justamente o objetivo perseguido.
Brian Fung, que é editor associado do portal The Atlantic emitiu opinião similar.
Para ele, o melhor motivo para se adotar a pratica da agricultura orgânica é diminuir a possibilidade de surtos de bactérias resistentes no futuro. Para ele, comprar produtos orgânicos significa respeitar a natureza, que é seu local de origem. Significa tomar as dores para que as fazendas permaneçam produtivas mesmo daqui a décadas. A dinâmica move-se em parte pelo interesse pessoal de longo prazo, e em outra parte por princípios éticos.
O problema é também uma questão de saúde pública, o que já ficou evidente nos dias de hoje com o problema do desenvolvimento de cepas de bactérias resistentes a antibióticos. As fazendas normais têm adicionado antibióticos nas rações animais há muitas décadas, mesmo sabendo desde os anos 70 dos riscos em potencial dessa prática para a população humana.
Em seu artigo “Eat organic: it’is good for other peoples health” no Earth Island Journal, Jason Mark, também defende os orgânicos com uma argumentação contundente.
Seu principal ponto é o fato de que a agricultura orgânica preserva a saúde dos trabalhadores rurais, e de suas famílias, argumento suficiente para justificar o investimento.
Jason atenta para o fato de que quando os pesticidas são aplicados, se espalham pelo ar, pela água e pelas roupas das pessoas. Recorda os mais de 35 incidentes por ano, em média, com pesticidas ocorridos somente na Califórnia nos últimos anos, causando problemas de saúde na população. Também cita um estudo feito pela Universidade de Michigan que concluiu que filhos de fazendeiros apresentam maior exposição aos pesticidas do que os filhos de outros profissionais, além de mencionar pesquisas feitas no México que apontaram que 20%dos trabalhadores rurais apresentavam contaminação aguda das mãos por venenos.
Os impactos relatados por Jason na saúde desses trabalhadores não são pequenos, incluindo problemas digestivos, neurológicos, respiratórios, circulatórios, dermatológicos, renais e reprodutivos. Outro estudo apontaria o fato de que a exposição pré-natal a pesticidas organofosforados pode reduzir o QI do feto, sendo os fetos masculinos potencialmente mais vulneráveis.
As cartas estão na mesa e cabe a você decidir em quem acreditar e por quais argumentos.
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