Apenas 3% das terras do mundo permanecem ecologicamente intactas, com populações saudáveis de todos os seus animais originais e habitat não perturbado. A conclusão é de um estudo publicado ontem (15) na revista científica Frontiers in Forests and Global Change.
Esses fragmentos de vida selvagem não danificados pelas atividades humanas encontram-se principalmente nas florestas tropicais da Amazônia e do Congo, na tundra e nas florestas do leste da Sibéria e do norte do Canadá e no Saara. As espécies exóticas invasoras, incluindo gatos, raposas, coelhos, cabras e camelos, tiveram grande impacto nas espécies nativas da Austrália, onde o estudo não detectou áreas intactas remanescentes.
A equipe sugere a reintrodução de um pequeno número de espécies importantes em algumas áreas danificadas, como elefantes ou lobos. Esse movimento poderia restaurar, segundo os pesquisadores, até 20% das terras do mundo à integridade ecológica.
Análises anteriores identificaram áreas selvagens com base em imagens de satélite e estimaram que 20 a 40% da superfície da Terra tem sido pouco afetada por humanos. No entanto, os cientistas por trás do estudo argumentam que, embora as florestas, savanas e tundras pareçam intactas quando vistas de cima, espécies vitais são escassos no solo.
Os elefantes, por exemplo, espalham sementes e criam clareiras importantes nas florestas, enquanto os lobos podem controlar as populações de veados e alces.
A nova análise combina mapas de danos humanos aos habitats com mapas que mostram onde os animais desapareceram de suas áreas originais ou estão constituindo uma população muito baixa para manter um ecossistema saudável.
Alguns cientistas dizem que a pesquisa subestima as áreas intactas, uma vez que as áreas de distribuição de animais há séculos são pouco conhecidas e os novos mapas não levam em conta os impactos da crise climática, que está alterando as áreas de distribuição das espécies.
É amplamente aceito que o mundo está em uma crise de biodiversidade, com muitas populações de animais selvagens despencando, principalmente em virtude da destruição de habitats para agricultura e construção. Especialistas acreditam que uma sexta extinção em massa da vida na Terra está começando, com sérias consequências para os alimentos, água e ar limpos dos quais a humanidade depende.
Ao jornal The Guardian, Dr. Andrew Plumptre, autor principal do estudo, afirmou que “muito do que consideramos como habitat intacto corresponde a espécies ausentes que foram caçadas por pessoas, ou perdidas por causa de espécies invasivas e doenças”.
Segundo ele, a restauração dos ecossistemas em curso atualmente está se concentrando nos habitats degradados, mas é preciso também pensar em restaurar espécies para que seja possível construir áreas onde existem ecossistemas ecologicamente intactos.
A pesquisa utilizou mapas da Lista Vermelha da União Internacional para Conservação da Natureza que ilustram a situação de 7.000 espécies no ano de 1.500 e hoje. A maioria dos dados contempla mamíferos, mas também inclui alguns pássaros, peixes, plantas, répteis e anfíbios. Muitas das áreas intactas identificadas estavam em territórios administrados por comunidades indígenas. A análise não incluiu a Antártica.
Cinco países detêm 70% das últimas regiões selvagens do mundo, revela o mapa
De acordo com Plumptre, pode ser possível aumentar a área ecológica intacta de volta para até 20% por meio das reintroduções direcionadas de espécies que foram perdidas em áreas onde o impacto humano ainda é baixo, desde que as ameaças à sua sobrevivência possam ser abordadas. Como exemplo, ele menciona o sucesso da reintrodução de lobos no parque nacional de Yellowstone, nos Estados Unidos, que transformou o ecossistema.
O professor Pierre Ibisch, da Universidade Eberswalde para o Desenvolvimento Sustentável na Alemanha, disse ao The Guardian que encontrar apenas 3% da terra intacta foi “previsivelmente devastador”. De acordo com Ibisch, “precisamos dar à natureza muito mais espaço para nos transportar para o futuro, [mas] temo que a reintrodução de algumas espécies em certas áreas possa não ser tão eficaz”.
Ibisch argumenta que a análise não levou em consideração a crise climática. “Acelerar as mudanças climáticas está se tornando a ameaça abrangente à funcionalidade de ecossistemas inteiros. A integridade dos mamíferos do passado dificilmente nos diz muito sobre o funcionamento dos ecossistemas na era do aquecimento global.
Em janeiro, mais de 50 países se comprometeram a proteger quase um terço do planeta até 2030 para deter a destruição do mundo natural. “Colocar esforços para conservar esses lugares [intactos] é muito importante”, diz Plumptre. “Além de raros e especiais, eles mostram como era o mundo antes que o impacto humano fosse significativo, ajudando-nos a medir o quanto perdemos ao longo do tempo”, finaliza.
Veja também:
- Perda de biodiversidade ameaça bem-estar das gerações atuais e futuras
- Ibama pede paralisação de turbinas de Belo Monte por morte de peixes
- Pesca comercial está presente em mais da metade dos oceanos do planeta, revela estudo
- Entenda situação de animais e plantas em meio às queimadas na Amazônia
- Ação humana pode estar diminuindo o número de espécies existentes em âmbito local
- Ação humana devastou fauna na América Latina, aponta estudo