Evidências recentes começam a mostrar que classe de inseticidas comumente usados pode se espalhar pelo meio ambiente e afetar polinizadores, predadores e outros insetos que eles não pretendiam matar. Pesquisadores alertam que essas substâncias, chamadas de neonicotinoides, apresentam um potencial de contaminação ambiental generalizada.
Em uma opinião publicada na revista Proceedings of the National Academy of Sciences, pesquisadores da North Carolina State University e da Pennsylvania State University defenderam a redução do uso de inseticidas neonicotinoides, interrompendo a prática de aplicá-los preventivamente em sementes de safras, uma vez que essa prática é de uso amplo nos Estados Unidos e um estudo concluiu que ela beneficia apenas uma pequena fração dos campos de cultivo.
Os autores do artigo argumentam que a redução desta e de outras práticas preventivas comuns poderia reduzir os efeitos em cascata sobre o meio ambiente de inseticidas cujos riscos não foram totalmente caracterizados. “Como a pesquisa se concentrou na transmissão do inseticida de uma planta para uma praga específica e daí para um predador da praga, ela ignorou as centenas de outros herbívoros que também interagem com aquela planta e também a transmissão desse material para seus predadores. É daí que surgem as nossas preocupações com relação à teia alimentar“, afirma Steven Frank, co-autor do parecer e professor do Departamento de Entomologia e Patologia Vegetal da North Carolina State University.
Desde sua introdução, no início da década de 1990, os neonicotinóides se tornaram os inseticidas mais usados no mundo, afirmam os pesquisadores. Em 2014, esses produtos representaram 25% do mercado global de pesticidas, relatam outros cientistas. Os autores também disseram que eles estão entre os inseticidas mais tóxicos para insetos já desenvolvidos.
Esses inseticidas são usados em plantações, gramados e paisagens, na produção de gado e até mesmo em produtos para tratar pulgas e carrapatos em animais de estimação. Eles também são usados em paisagens comerciais e para proteger árvores. Os neonicotinóides foram usados para tratar 200.000 árvores de cicuta no Parque Nacional das Montanhas Great Smoky, por exemplo. “Eles são aplicados a centenas de milhares de árvores a cada ano para proteção contra pragas exóticas, que podem ser letais para as árvores, mas também contra pragas cosméticas, que geralmente não são letais”, disse Frank.
Recentemente, um estudo descobriu uma nova maneira como os neonicotinoides podem se espalhar pela cadeia alimentar. Publicado no ano passado nos Anais da Academia Nacional de Ciências, o estudo conduzido por pesquisadores do Instituto de Pesquisa Agrícola de Valência mostrou que os neonicotinóides podem ser transmitidos em um líquido açucarado chamado “melada” que é excretado por certos insetos como pulgões, cochonilhas e mosca branca. A toxina é ingerida por outros insetos que comem a melada, como hoverflies ou vespas parasitóides.
“Sabemos que os neonicotinóides podem ser transmitidos através do néctar e do pólen e podem prejudicar os polinizadores dessa forma, por meio de sua presença direta nas plantas”, disse Frank. “Sabemos que se os herbívoros se alimentarem das plantas e os predadores comerem esses herbívoros, eles podem ser prejudicados porque os neonicotinóides se acumulam nos corpos dos herbívoros. Esta pesquisa trouxe uma nova revelação de que o inseticida poderia ser transmitido através de um herbívoro ao meio ambiente por meio de um carboidrato do qual muitos animais se alimentam.”
Os autores disseram que isso aumenta o potencial de danos a organismos que não são o alvo da substância, pois a toxina é espalhada por organismos que não são mortos ao ingeri-la. “Isso adiciona mais um exemplo de como o material pode se mover em uma cadeia alimentar – da planta para um herbívoro e daí para um predador”, explica Frank. “Isso já foi documentado algumas vezes. Nossa preocupação é que, se puder fazer isso, parece evidente que pode se espalhar muito mais por toda a teia alimentar, porque as populações de insetos são muito diversas e abundantes nas plantas.”
Frank disse que a preocupação deles vai além dos insetos. Se ingeridos por organismos que não são mortos diretamente, esses organismos podem transmitir a toxina para insetos, pássaros, anfíbios ou outros. “Os insetos são alimento para milhares de vertebrados diferentes – de pássaros a ratos, lagartos e sapos e peixes”, disse Frank. “Todos esses animais comem insetos. Conforme o ambiente se enche de insetos contaminados, outros organismos podem estar comendo essas substâncias químicas. Embora os neonicotinóides tenham toxicidade relativamente baixa em mamíferos, o que os torna mais seguros para os aplicadores, ainda há risco de alguma toxicidade para outros vertebrados.”
Os autores disseram que uma forma potencial de restringir seu uso é evitar usá-los preventivamente como cobertura de sementes em campos agrícolas, onde se demonstrou que têm benefícios limitados. Um estudo descobriu que eles beneficiam apenas 5% dos campos agrícolas quando aplicados preventivamente nas sementes. “Estamos colocando esses materiais no meio ambiente, embora, em alguns casos, não haja nenhum benefício tangível para eles”, disse Frank. “Parece que seu uso poderia ser restringido substancialmente sem prejudicar os agricultores ou a economia.”
Mais pesquisas são necessárias, disse Frank, para entender o efeito total dos neonicotinóides sobre a teia alimentar e o meio ambiente. “A preocupação é com a biodiversidade em geral, onde não sabemos até que ponto esses materiais viajam pela teia alimentar e quais são as consequências”, explica Frank. “Estamos vendo a biodiversidade de insetos e outras coisas diminuindo ao redor do mundo. Há uma infinidade de fatores contribuindo para isso e cuja extensão não sabemos, mas esses inseticidas podem estar desempenhando um papel. E a outra preocupação é com a contaminação do meio ambiente como um todo.”
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