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Projeto foi desenvolvido por cientistas do Instituto Potsdam de Pesquisas sobre o Impacto Climático, na Alemanha

Imagem de TNeto por Pixabay

Pela primeira vez, pesquisadores desenvolveram um modelo capaz de antecipar os períodos de seca na Amazônia com até 18 meses de antecedência. O estudo foi conduzido por cientistas do Instituto Potsdam de Pesquisas sobre o Impacto Climático (PIK), na Alemanha, como parte do projeto TiPES, liderado pela física Catrin Ciemer, e publicado no periódico Environmental Research Letters.

O modelo foi desenvolvido com base em análises da temperatura de superfície do Oceano Atlântico. Como na natureza tudo está interligado, a relação entre a umidade dos oceanos e o regime de chuvas na Amazônia faz parte da engrenagem intrínseca aos biomas. Qualquer variação na temperatura, como resultado do aquecimento global, é suficiente para desencadear uma série de consequências.

Segundo o físico e coautor do estudo, Niklas Boers, o sistema de alerta desenvolvido pelo grupo tem como base um mecanismo muito simples. “Descobrimos que, a cada dois anos, as temperaturas de superfície no Atlântico Tropical Norte e Sul desenvolvem um dipolo, fenômeno que ocorre quando as temperaturas aumentam em uma região e diminuem em outra.”

De acordo com o pesquisador, o alerta de previsão de seca é emitido quando esse mesmo padrão começa a se desenvolver. “O dipolo modifica a direção dos ventos alísios, que levam umidade do Oceano Atlântico para a América do Sul. Essa alteração de rumo é a responsável por causar secas principalmente no centro-sul da Amazônia”, afirma Boers. A partir do modelo desenvolvido, os pesquisadores conseguiram prever seis entre os sete principais eventos de estiagem desde a década de 80.

Para o climatologista Carlos Nobre, o aquecimento global está fazendo com que a fase de águas aquecidas ao norte esteja mais forte e presente — no futuro, deve-se esperar que o sul da Amazônia fique menos úmido. “As megassecas de 2005, 2010 e a de agora estão associadas diretamente ao aumento das temperaturas no Oceano Atlântico Tropical Norte”, explica. “Contudo, diferentemente dos anos anteriores, a de agora iniciou sua ação em maio e em junho. Ou seja, não interferiu com as chuvas durante a estação de verão. Ainda é cedo para afirmar que as águas mais quentes continuarão ao longo dos meses e que irão causar uma seca continuada até a próxima estação chuvosa.”

Em um contexto de aquecimento global, há uma relação íntima entre o aumento da temperatura dos oceanos e o equilíbrio ambiental. Mesmo nos rincões da floresta, ninguém está tão isolado assim — o que acontece em alto-mar pode ter impactos na vida da população amazônica.

Para a oceanógrafa e analista de Ciência e Conservação da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza, Janaína Bumbeer, não basta entender um aspecto da ecologia, é necessário compreender os fenômenos de forma sistêmica. “A relação entre a temperatura do oceano, o clima e os ventos é muito delicada. Qualquer aumento de 1 ºC afeta o regime de chuvas no continente”, afirma. Quanto maior a frequência de anomalias nos mares, mais recorrentes serão os eventos climáticos extremos.

Diante dos efeitos das mudanças climáticas, existe o risco de o Hemisfério Norte aquecer mais rapidamente do que o Sul, o que estimularia a ocorrência do dipolo e uma frequência mais intensa de secas na Amazônia.

Mesmo com a possibilidade de prever um período de estiagem na região, há pouco a se fazer para de fato mitigar os impactos diretos na floresta. Aqueles que vão se beneficiar com as informações são as pessoas que vivem na Amazônia, especialmente produtores rurais, comunidades tradicionais, indígenas e os que dependem do transporte fluvial para se locomover — os níveis da água podem ficar tão baixos que a navegabilidade se torna inviável. “Indiretamente, é possível ter uma influência positiva no ecossistema amazônico. Quanto maior a antecedência para que fazendeiros e comunidades tradicionais possam se planejar, menos traumática será a interferência do clima”, explica Boers.

Com a seca, outra preocupação diz respeito ao aumento de queimadas, diretamente associadas ao desmatamento ilegal. Em setembro deste ano, foram registrados 31.017 focos de calor, de acordo com os dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o segundo pior setembro da década e um aumento de 60% em comparação ao mesmo mês do ano passado. Por ser uma floresta tropical úmida, o fogo não faz parte da dinâmica do bioma. A ocorrência de incêndios costuma ser associada às ações antrópicas. Em períodos de estiagem, os focos de calor terão condições favoráveis para crescerem em extensão e com impactos maiores para o ecossistema.

“Há inúmeras evidências sobre a possibilidade de a floresta se transformar em uma savana pelos efeitos da ação humana. O bioma já está bem próximo do ponto de não retorno”, afirma Boers. Tal efeito em larga escala levaria ao aumento de emissões de CO2 na atmosfera, o que, por sua vez, tem o efeito de acelerar ainda mais o aquecimento global. Do começo ao fim, os fenômenos da natureza estão interligados. Enquanto a sociedade seguir o modelo econômico de produção atual, os efeitos para o planeta serão cada vez piores, ao ponto de colocar em risco a maior floresta tropical do mundo e a sua riquíssima biodiversidade.



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